Na véspera, os contratos de juros futuros já tinham disparado na BM&F por culpa do susto pregado pelo IPCA de maio, pior que a mais negativa das previsões. E ontem deram novos saltos por indução da ata da reunião do Copom realizada na semana passada. O documento amplificou o tom severo das manifestações anteriores do Banco Central, já marcadas pela dureza e a insensibilidade. O debate entre os analistas que acreditavam no prosseguimento do ciclo de alta da Selic e os que defendiam a interrupção imediata devido aos estragos já produzidos na atividade econômica, foi resolvido rispidamente pela ata em favor dos primeiros.
A sisudez monetária patrocinou nova inclinação da curva futura de juros. A taxa para a virada do ano avançou de 14,15% para 14,25%, quando abriu a semana em 14,06%. No dia da reunião à qual a ata se refere, 3, esse DI fechou em 13,99%. O contrato com vencimento em janeiro de 2017 — o que tem, portanto, a incumbência de espelhar a política monetária que deverá ser executada no ano que vem —, passou de 13,76% para 13,90%. O recado é que, se a Selic parar de subir quando chegar a 14,25% no mês que vem, ficará longo período nesse degrau antes de começar a cair. O contrato longo de maior liquidez, com liquidação em janeiro de 2021, deveria ter caído, acentuando a inclinação negativa da curva, como prova de que o mercado confia na austeridade do BC, mas subiu de 12,75% para 12,79%. O raciocínio é o de que, se de fato o BC “vigilante” fizer agora “tudo o que for necessário”, de forma “determinada e perseverante” para trazer a inflação à meta poderá no futuro dispensar o uso extravagante do juro alto. Por enquanto, há dúvida quanto a isso.
A ata alterou a temporalidade dos eventos. Os juros dispararam na BM&F porque o documento não se limitou a explicar os motivos que levaram o Comitê a subir a Selic de 13,25% para 13,75% no dia 3, mas avançou no tempo, e selou a decisão que será tomada oficialmente só na próxima reunião, marcada para 29 de julho: vai elevar a taxa básica de novo em 0,50 ponto, para 14,25%. Para por aí? Dificilmente, pois o BC vem dinamitando todas as pontes atrás de si que tornariam viável um retrocesso honroso. Com o passar dos meses, a autoridade azeda cada vez mais o seu discurso desinflacionário. Cresce a sua irritação com a teimosia do IPCA corrente e a resistência do mercado em considerar verdadeira a sua garantia de que a inflação fechará 2016 nos 4,5% do centro da meta. IPCA e mercado parecem debochar do BC. E a sua resposta irada consiste em apertar ainda mais o pescoço da economia.
O mercado vinha supondo que a ata não seria definitiva a respeito do próximo passo. Por duas razões. A primeira é que falta ainda muito tempo até a reunião de julho, e novos e mais frescos indicadores sobre atividade, emprego e inflação serão conhecidos. A segunda é que o Relatório de Inflação (RI) referente ao segundo trimestre do ano será publicado no final deste mês. Peça-chave do sistema de metas inflacionárias, o RI poderia trazer novidades auspiciosos sobre o processo de convergência do IPCA ao centro da meta no final de 2016. Se o BC não resolveu esperar o RI é porque ainda não será nesta edição que o modelo consagrará a convergência.
Além das costumeiras advertências de que os esforços monetários até agora efetuados “ainda não se mostram suficientes” e de que permanece “vigilante”, a ata entronizou duas palavras “hawkish” — determinação e perseverança — proferidas antes em discurso do presidente Alexandre Tombini no seminário de metas de inflação. Depois de reconhecer que “a inflação tende a permanecer elevada em 2015”, acrescentou que é preciso “determinação e perseverança para impedir sua transmissão para prazos mais longos”. O BC poderá ser perseverantemente determinado no seu trabalho de asfixia da atividade econômica porque ainda não está convencido de que a coisa é grave. Chama atenção a desapiedada indiferença com que trata o tema do desaquecimento econômico. Queda da produção industrial de 7,6% em abril sobre o mesmo mês de 2014? O BC diz que o consumo privado mostra “sinais de moderação”. Desemprego de 8% em abril como revelou a PNAD Contínua? Para o BC, trata-se do “início de um processo de distensão” do mercado de trabalho. No mundo do BC não há recessão, mas “moderação” e “distensão”.
A aceleração do IPCA de maio e a ata do Copom deixaram atônita a parcela do mercado que esperava o fim iminente do ciclo de arrocho monetário. Quem apostava em apenas mais uma alta de 0,25 ponto em junho ou acreditava (caso do Banco Itaú) que a elevação de 0,50 ponto feita na semana passada tinha sido a última, teve de mudar de ideia.
O dólar chegou a influenciar o movimento de alta dos DIs futuros. Mas o efeito foi efêmero. De manhã, a moeda chegou a subir 1,84%, cotada a R$ 3,1720, como reação dos investidores à decisão do BC de restringir a oferta de swaps cambiais destinados a rolar os que irão vencer no dia 1° de julho. O BC iniciou o mês com promessa de renovar 80% do lote de US$ 8,74 bilhões, resgatando US$ 1,75 bilhão, mas mudou de ideia ontem e reduziu a oferta para 75%. Com isso, amplia o resgate em US$ 440 milhões. Não configura nenhum trauma, pois trata-se de volume equivalente a cerca de um terço do movimento de um dia normal. Mas como os investidores não gostam de correr riscos, a fatia que não mais será coberta pelo BC foi rapidamente reposta via mercado privado. Substituído o hedge, o dólar seguiu a tendência natural de baixa. E fechou a R$ 3,1060, em desvalorização de 0,28%.
O dólar enfraqueceu-se em sintonia com a suspensão do movimento de alta traçado pelo rendimento do título americano de 10 anos em preparação para a reunião da semana que vem do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) do Federal Reserve. As taxas das “treasuries” recuaram por dois motivos. O primeiro foi a divulgação de dados mais fracos sobre a recuperação dos EUA. As vendas varejistas se elevaram em 1,2% em maio, quando os analistas projetavam alta um pouco maior, de 1,3%. E os novos pedidos de auxílio-desemprego cresceram em dois mil, para 279 mil, ante expectativa de queda também em dois mil, para 275 mil. O segundo foi pesquisa junto ao mercado feita pelo “The Wall Street Journal” segundo a qual 72% dos economistas acreditam que a alta da taxa básica de juros americana irá ocorrer em setembro. Ou seja, o mercado ainda tem três meses para se adaptar à mudança. A T-Note de 10 anos caiu de 2,48% para 2,39%.