Por bruno.dutra

Brasília - A escalada do dólar, que vem batendo recordes de alta e que, na semana passada, atingiu a máxima em 12 anos, deverá pressionar ainda mais a inflação em 2015 e obrigar o Banco Central (BC) a estender o ciclo de aperto nos juros básicos. Analistas calculam que uma depreciação cambial de 10%, a persistir por um ano, aumenta em meio ponto percentual o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

Acontece que, a julgar pelo comportamento corrosivo da moeda americana, o estrago poderá ser ainda maior. Neste ano, o dólar pulou de R$ 3 para até R$ R$ 3,30, durante a última semana. Não por outro motivo, o mercado financeiro deverá elevar, pela 12ª semana consecutiva, a projeção para a inflação oficial em 2015. A expectativa é que o Boletim Focus, que será divulgado hoje, pelo BC, considere uma carestia acima de 8% este ano. Seria a maior inflação desde 2003.

A incerteza diante do comportamento do dólar levou a uma série de remarcações nos preços dos contratos de juros futuros, que passaram a prever um aperto ainda mais duro da Selic, para tentar reancorar as expectativas de inflação. A pedido do Brasil Econômico, o professor de finanças Alexandre Cabral calculou a curva de juros a termo dos negócios do Depósito Interfinanceiro (DI). Em média, o mercado aposta que o ajuste na Selic somará mais 1,5 ponto percentual, a serem divididos nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom). Para o encontro de abril, a aposta é de uma alta de 0,75 ponto. Em junho, seria mais 0,5 ponto. Uma terceira alta, de 0,25 ponto, encerraria o ciclo, em julho.

Esse aperto monetário visa garantir a queda da inflação em 2016, e não mais em 2015, conforme admitem fontes governistas. Esta semana, na quinta-feira, o BC deverá divulgar a mais recente edição do relatório trimestral de inflação. A expectativa é que, pela primeira vez, o documento traga uma projeção para o IPCA acima do teto da meta, em sintonia com as estimativas do mercado financeiro. Para 2016, no entanto, o BC manterá o otimismo, e continuará apostando numa inflação dentro da meta, de 4,5%, no fim do ano.

Fontes reiteraram que, por mais dura que seja a tarefa, não será a primeira vez que a inflação cairá drasticamente de um ano para outro. Em setembro de 2011, por exemplo, o IPCA cravou alta de 7,31% e desacelerou “brutalmente” apenas nove meses depois, quando atingiu 4,92%. Este, por sinal, foi o menor resultado da inflação durante todo o governo Dilma Rousseff.

Melhorar esse quadro depende não só da rigidez com que o BC pesará a mão sobre os juros, mas, sobretudo, do comportamento do câmbio. A preocupação é grande, porque o repasse do dólar não ocorre apenas via aumento de preços de bens de consumo durável importados, como computadores e eletrodomésticos. Os analistas estimam que um quinto da produção nacional utilize insumos vindos do exterior. E, até itens do dia a dia do brasileiro, como a farinha para a fabricação de massas e pães, e o feijão preto, muito utilizado na culinária de vários estados, são trazidos de outros países, como a Argentina e a China.

Mesmo a conta de luz também poderá ficar mais cara com a disparada do dólar, assinala o economista sênior do Besi Brasil, Flávio Serrano. Ele calcula que as tarifas de energia subirão 52% em 2015, por causa, sobretudo, da bandeira tarifária. Serrano avisa, porém, que a projeção poderá ser revisada para cima por causa da forte alta da moeda dos EUA. “O câmbio tem impacto no preço pago pelas concessionárias pela energia da usina de Itaipu”, disse. Atualmente, a hidrelétrica mantida por Brasil e Paraguai fornece 17% da eletricidade nacional.

Os preços mais elevados das tarifas, combinados a reajustes pesados na gasolina, fizeram os preços administrados acelerarem na passagem de fevereiro para março, indicou na sexta-feira o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em 12 meses, a taxa pulou de 8,57% para 11,47%. E ainda pode piorar. “Os reajustes no primeiro semestre deste ano terão impacto relevante na elevação dos preços, fazendo com que a taxa de inflação acumulada em 12 meses se descole bastante do teto da meta”, assinalou a economista-chefe da Rosenberg Associados, Thaís Marzola Zara, que estima em 13,1% a alta dos preços administrados este ano.

O comportamento corrosivo do dólar tende a tornar a inflação mais pesada justamente neste início de ano. Entre analistas, há quem aposte que o IPCA acelerará a alta para 9%, no acumulado em 12 meses, em março. Nem todos, no entanto, acreditam num cenário tão preocupante para a escalada de preços. “Pessimismo nunca é demais. O problema é que, em geral, ele não se realiza”, observou o ex-diretor de Política Monetária do BC e sócio fundador da Mauá Sekular, Luiz Fernando Figueiredo.

Carlos Thadeu Filho, economista-chefe da Franklin Templeton Investments, chama a atenção para o fato de que, embora a inflação esteja elevada e deva continuar pressionando o bolso dos consumidores pelo menos neste início de ano, ela deverá perder força ao longo de 2015, principalmente por causa da fraqueza da economia. Cálculos da gestora de fundos dão conta que o Produto Interno Bruto (PIB) poderá encolher entre 0,7% e 1% este ano. Assim, mesmo uma depreciação mais intensa do real tende a produzir menos impacto sobre os preços. “Existe um trabalho do BC que mostra que, quando a economia está abaixo do PIB potencial, esse repasse do câmbio para a inflação é menor”, emendou.

O analista trabalha com duas projeções para o IPCA. Na primeira, tendo em vista uma pressão menor do dólar, a inflação subiria 7,6% em 2015. Na segunda, que considera a hipótese de que o dólar se estabilize em patamar elevado durante todo o ano, essa projeção sobe para 8,10%.

“Essa volatilidade da moeda dos Estados Unidos gera uma incerteza brutal sobre a inflação”, emendou Flávio Serrano, do Besi Brasil. “Este ano, o IPCA pode ser 9%, como também pode ser 7%”, disse, acrescentando que, por ora, a falta de previsibilidade é que tem ditado os negócios econômicos.

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