Marcha contra "russofobia" na AlemanhaAFP

Desde lojas russas manchadas com tinta até insultos nas ruas, as agressões à comunidade russa na Alemanha se multiplicaram após a invasão da Ucrânia, o que faz com que as autoridades temam que o conflito seja importado a seu território.
Para denunciar a "russofobia" na Alemanha, o país que abriga a maior diáspora russa da União Europeia, caravanas com bandeiras russas estão sendo organizadas, o que gerou críticas por sua falta de distanciamento da ofensiva militar russa.
No último domingo (10), ocorreram manifestações em Frankfurt e Hanôver. No sábado, houve marchas em Lübeck e Stuttgart, que reuniram centenas de pessoas para denunciar a "discriminação" antirrussa.
Christian Freier, de 40 anos, organizador de uma carreata em Berlim que reuniu 400 veículos, contou que recebe centenas de ameaças de morte todos os dias.
O site de sua oficina de automóveis foi hackeado e seu índice de visitas despencou. "Minha vida é um inferno", se queixa este russo-alemão.
Esta mobilização gerou comoção na esfera política alemã, já que coincidiu com a difusão das informações sobre o massacre na localidade ucraniana de Bucha.
"Meu objetivo era somente protestar contra as agressões diárias contra os russos na Alemanha", garantiu Freier, que insiste que a manifestação não tinha nada a ver com o conflito, sobre o qual não quis falar.
Desde o início da invasão russa da Ucrânia, foram reportados à polícia 383 delitos antirrussos e 181 delitos antiucranianos.
Na Alemanha vivem cerca de 1,2 milhão de pessoas de origem russa e uma comunidade de 325.000 ucranianos, aos quais se somam 316.000 refugiados de guerra que chegaram recentemente.
- 'Procissão da vergonha' -
"Toda guerra é condenável e nenhuma é justificável", acrescentou um dos organizadores da marcha em Berlim, o alemão René Hermann, de 50 anos.
Contudo, longe dos jornalistas, este homem tem um blog com milhares de seguidores na rede social Tiktok. Até a suspensão recente de sua conta, divulgou diversas mensagens típicas da propaganda a favor do Kremlin.
Em uma delas, assinalou que "prisioneiros contam que Kiev ordenou encenar um massacre para manipular a opinião ocidental".
"As motivações para participar nessas manifestações são heterogêneas", explicou Jochen Töpfer, sociólogo da Universidade Otto-von-Guericke de Magdeburgo e especialista na sociedade russa.
"O organizador falou de uma manifestação contra a discriminação na Alemanha. Ao seu lado participam seguidores de Putin, certamente, ou pessoas que não gostam de Putin, mas que tampouco querem ver seu país [a Rússia] desacreditado, apesar da guerra", disse Töpfer à AFP.
A marcha em Berlim suscitou uma onda da indignação nacional que o jornal Bild qualificou como as "carreatas da vergonha". No domingo, o meio acusou os participantes das novas mobilizações de serem "seguidores de Putin" que "negam os crimes de guerra".
"Por amor de Deus, como é possível autorizar esta marcha de carros da vergonha no meio de Berlim?", preguntou o embaixador ucraniano na Alemanha, Andrij Melnyk, dirigindo-se à prefeita berlinense, Franziska Giffey.
Ela disse "compreender" sua chateação, mas esclareceu que não pode proibir uma manifestação na qual foram hasteadas "bandeiras russas".
- Russos 'ocidentalizados' -
As autoridades de segurança "monitoram de perto até onde os cidadãos russos, e também ucranianos, são um perigo na Alemanha", declarou a ministra do Interior alemã, Nancy Faeser.
"Devemos zelar muito atentamente que esta guerra não seja importada a nossa sociedade", acrescentou.
Mas o investigador Tobias Rupprecht da Universidade Livre de Berlim duvida dessa hipótese: "a maioria dos russos aqui tem uma imagem bastante crítica do conflito, tendem a ser mais ocidentalizados que os russos na Rússia".
No entanto, "quanto mais durar a guerra, maior é o risco de ver mais crimes cometidos nesse contexto na Alemanha", advertiu Töpfer.
Outras organizações russas também condenaram as carreatas.
"Nós não toleramos que os poucos casos de discriminação sejam utilizados como pretexto para atos propagandísticos pró-Putin", sustentou a comunidade de alemães russos em Hesse.