ONGs suspendem atividades no Afeganistão após proibição de emprego a mulheresAHMAD SAHEL ARMAN / AFP
ONGs suspendem atividades no Afeganistão após proibição de empregar mulheres
Nos últimos meses, o movimento Talibã, que retornou ao poder em agosto de 2021, apertou o cerco às mulheres afegãs
ONGs estrangeiras anunciaram neste domingo (25) a suspensão de suas atividades no Afeganistão, depois que o regime talibã proibiu que mulheres trabalhem nessas organizações, medida que tornará difícil manter a ajuda humanitária ao país, segundo um funcionário do alto escalão da ONU.
"Enquanto não apresentam mais explicações sobre o anúncio, suspendemos nossos programas e exigimos que homens e mulheres possam continuar, em igualdade de condições, com nossa ajuda para salvar vidas no Afeganistão", declararam em comunicado as ONGs Save the Children, Conselho Norueguês para os Refugiados e CARE.
Outra ONG, o Comitê Internacional de Resgate (IRC) anunciou pouco depois a suspensão de suas atividades no país: "Se não estivermos autorizados a empregar mulheres, não poderemos prestar serviços a quem precisa."Dezenas de representantes de ONGs e funcionários da ONU que atuam no Afeganistão se reuniram neste domingo para discutir a situação."
Se (as autoridades do Talibã) não estiverem em condições de revogar esta decisão e encontrar uma solução para este problema, será muito difícil continuar e fornecer ajuda humanitária de maneira independente e justa, porque a participação das mulheres é muito importante", declarou à AFP o coordenador humanitário da ONU para o Afeganistão, Ramiz Alakbarov.
Impacto devastador
Karen Decker, representante dos Estados Unidos no Afeganistão, pediu explicações ao governo fundamentalista. "Como representante do maior doador de ajuda" a este país, "acredito que tenho o direito de perguntar aos talibãs como eles pretendem evitar que as mulheres e crianças morram de fome, se as mulheres já não podem distribuir ajuda a outras mulheres e crianças", tuitou hoje, em vários idiomas.
O porta-voz dos talibãs, Zabihulah Mujahid, respondeu, na mesma plataforma: "Não permitimos que ninguém diga nada nem faça ameaças relacionadas às decisões da nossa liderança em matéria de ajuda humanitária".
A Organização para a Conferência Islâmica (OIC) condenou a proibição neste domingo e seu secretário-geral, Hissein Brahim Taha, apelou "fortemente" ao regime talibã para rever sua decisão, considerando-a "contrária aos interesses do povo afegão".
No comunicado enviado às ONGs neste sábado (24), o Ministério da Economia ordenou que elas parassem de empregar mulheres, sob pena de perder a autorização para trabalhar no país. A decisão foi justificada por "denúncias" de que as mulheres que trabalhavam nessas organizações não respeitavam o uso do véu islâmico.
No Afeganistão, as mulheres são obrigadas a cobrir o rosto e o corpo inteiro. A ONU e as agências de cooperação destacam que mais da metade dos 38 milhões de habitantes do precisarão de ajuda humanitária durante o inverno rigoroso.
Dezenas de organizações trabalham em regiões remotas do Afeganistão e muitas empregam mulheres."Não queremos interromper a ajuda imediatamente, pois isso prejudicaria o povo afegão", disse Ramiz Alakbarov, enfatizando que o veto terá um impacto "devastador" na já deteriorada economia do país.
Cerco às mulheres
Nos últimos meses, os talibãs, que retornaram ao poder em agosto de 2021, apertaram o cerco às mulheres. Há menos de uma semana, elas foram vetadas nas universidades do país por "desrespeito" ao código de vestimenta.
E desde março estão proibidas de frequentar as escolas do ensino médio.As mulheres também foram excluídas de vários empregos públicos e não podem viajar sem a presença de um parente homem. O Talibã também proibiu o acesso a parques, jardins, academias e banheiros públicos.
"O retrocesso flagrante mais recente dos direitos das meninas e das mulheres terá consequências de grande alcance para a prestação de serviços de saúde, nutrição e educação das crianças", tuitou o diretor regional do Unicef, George Laryea-Adjei.
Uma afegã de 27 anos contou à AFP, sob anonimato, que começaria a trabalhar neste domingo para uma ONG estrangeira.
"O trabalho árduo que fiz nos últimos anos no campo da educação foi destruído", lamentou.
Shabana, 24 anos, funcionária de uma ONG em Cabul, também falou sobre a mudança. "Somos 15 na minha família e eu sou o único sustento. Se eu perder meu emprego, minha família vai passar fome", disse.
"Enquanto vocês celebram a chegada do ano novo, o Afeganistão se torna um inferno para as mulheres."
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