A parcela de 1% da população mais privilegiada detém praticamente metade da riqueza global, revelou estudo do banco Credit Suisse, divulgado na terça-feira. A desigualdade no mundo está aumentando e isso pode representar um gatilho para a recessão, adverte o levantamento “Global Wealth Report 2014”, realizado pelo Credit Suisse Research, o grupo de pesquisa do banco sediado na Suíça.
A riqueza global das famílias do mundo aumentou 8,3% em um ano, alcançando um novo recorde: US$ 263 trilhões em 2013, mais do que o dobro da riqueza registrada no ano de 2000, que era de US$ 117 trilhões. O aumento da riqueza mundial foi de US$ 20 trilhões com relação a 2013: é o maior já ocorrido desde 2007. Desde 2008 esse volume vem crescendo. Hoje, a riqueza global está 20% acima do pico alcançado antes da crise econômica de 2008. Isso significa que mesmo com a economia global letárgica, os patrimônios cresceram. Alguns países registram, no entanto, retrocessos na riqueza global das famílias: Indonésia menos (US$260 bilhões), Argentina e Rússia (menos US$ 135 bilhões cada um) e Turquia (menos US$ 100 bilhões).
Com relação ao Brasil, o “Gigante adormecido”, como destaca o relatório, a renda familiar aumentou três vezes entre 2000 e 2014. “Assim como em outros países latino-americanos, o Brasil possui mais gente na faixa entre US$ 10 mil e US$ 100 mil comparado com o resto do mundo. Há um número menor nos dois extremos. Isso pode dar uma impressão enganosa de que a desigualdade está abaixo da média. Mas a desigualdade está relativamente alta”, ressalta o estudo, citando o coeficiente de Gini de 82%. O Brasil tem, de acordo com o estudo, 225 mil milionários e 296 mil adultos no topo dos 1% mais ricos.
No topo da pirâmide global de riqueza há 35 milhões de indivíduos (0,7% da população adulta global) com mais de US$ 1 milhão. Eles detém conjuntamente US$ 115,9 trilhões, ou seja, 44% da riqueza global. A segunda camada da pirâmide, dos que tem entre US$ 100 mil e US$ 1 milhão, somam 373 milhões de adultos (7,9% da população mundial), com US$ 108,6 trilhões. Somadas as duas camadas do topo da pirâmide (ou seja, os que detém um patrimônio superior a US$ 100 mil), são 400 milhões de pessoas, bem mais do que em 2000, quando havia 217 milhões de ricos.
A classe média global é composta por pouco mais de 1 bilhão de pessoas que tem entre US$ 10 mil a US$ 100 mil: representam 21,5% da população adulta global, com uma riqueza de US$ 31 trilhões. O estudo destaca um contraste com relação à classe média dos dois gigantes emergentes asiáticos. A Índia, com seus 1,2 bilhão de habitantes, tem apenas 3% da classe média global. Esta percentagem, ressaltou o levantamento, mudou muito pouco na última década, período em que o país cresceu bastante, após a abertura de sua economia nos anos 90. Em contraste, a percentagem da classe média chinesa dobrou desde o ano 2000. Hoje, a classe média da China é mais de dez vezes maior do que a indiana e representa um terço do total desta categoria no mundo.
Na base da pirâmide, com menos de US$ 10 mil, estão 3,3 bilhões de indivíduos,que somam uma riqueza de US$ 7,6 trilhões. Esta base representa mais de 70% da população mundial de adultos. Mais de 90% da população adulta da Índia e da África estão incluídas no chão da pirâmide. Em alguns países africanos, esta porção mais empobrecida chega perto de 100% de suas populações.
Uma pessoa precisa de apenas US$ 3.650 — incluído neste cálculo o valor patrimonial de moradia — para integrar a metade dos mais ricos do mundo. Porém, é necessário mais de US$ 77 mil para pertencer aos 10% mais ricos, e US$ 798 mil, para ingressar no topo dos 1%. “Analisando em conjunto, a metade mais pobre da população mundial detém menos de 1% da riqueza total. Os 10% mais ricos concentram 87% da riqueza global, e o 1% do topo mais rico possui 48,2% dos ativos mundiais”, destaca o “Global Wealth Report 2014”.
A América do Norte é a região onde se concentra a maior riqueza das famílias (34,7%). Nos Estados Unidos estão 41% de pessoas do mundo com fortunas superiores a US$ 1 milhão. A Europa ocupa o segundo lugar (32,4%) no ranking da riqueza das famílias, seguida da região Ásia-Pacífico (sem incluir a China), com 18,9%.
Os indicadores da desigualdade diminuíram ligeiramente na Europa e nos EUA, mas desde 2000 vem vem se agravando na América Latina e na África, segundo o estudo do grupo de pesquisa do Credit Suisse. No início do ano, a ONG Oxfam, que faz campanha contra a pobreza global, havia divulgado pesquisa mostrando que as 85 pessoas mais ricas do planeta tinham uma percentagem de riqueza combinada equivalente aos 3,5 bilhões das pessoas mais pobres no mundo.
“Esses resultados evidenciam que a desigualdade é extrema, está crescendo e mostram que a recuperação econômica que se seguiu à crise global de 2008 tem favorecido os mais ricos”, disse ao jornal britânico “The Guardian”, Emma Seery, chefe da Seção de Desigualdade da Oxfam. “Em países pobres, desigualdade crescente significa a diferença entre as crianças terem chances de frequentar escolas e pessoas doentes terem acesso a remédios que salvam as suas vidas”, afirmou Seery. Com AFP