Por monica.lima

São Paulo - Após registrar uma listagem recorde de US$ 25 bilhões em sua oferta pública inicial de ações, realizada em setembro, o Alibaba tem como palavras de ordem a expansão de seus negócios internacionais. No entanto, entre os percalços naturais dessa jornada mundo afora, uma questão começa a ganhar contornos críticos para a gigante chinesa de varejo virtual: as suspeitas de que a empresa facilita a venda de produtos falsificados em suas plataformas, que unem vendedores e compradores em todo o mundo.

O marco desse desafio é um processo movido nesta semana pela Kering — dona de marcas de luxo como a Gucci e a Yves Saint Laurent —, em Nova York. Mas esse risco não está restrito aos tribunais americanos. Um dos principais mercados alvo do Alibaba nesse novo momento, o Brasil também possui exemplos similares de casos que podem alcançar a esfera legal e ampliar os problemas do grupo em escala global.

Em uma rápida pesquisa nas plataformas do Alibaba, é possível encontrar imitações — grosseiras ou não — de produtos de marcas brasileiras. Entre os itens disponíveis para venda e que vão muito além da simples inspiração no design, estão produtos como as sandálias Melissa e as famosas Havaianas. Procuradas, Grendene e Alpargatas — responsáveis, respectivamente, pelas duas marcas — não encontraram executivos disponíveis para comentar o tema.

O Brasil começou a entrar no radar do Alibaba há cerca de 4 anos, com o lançamento da versão em português da plataforma. O país ganhou maior importância a partir do início de 2014. Com uma meta de gerar mais de 50% de seu faturamento no exterior, a busca pelo fortalecimento dos negócios no mercado brasileiro seguiu um movimento que já havia incluído a Índia e que também passou a envolver o mercado russo.A companhia aprimorou a versão brasileira do site e estendeu seu foco aos compradores locais, ante o objetivo inicial de mirar os fornecedores.

Mesmo sem uma operação no país, a estratégia também se traduziu em iniciativas como a contratação de profissionais brasileiros nos escritórios da empresa em Hangzhou, na China, para auxiliar no processo de compreensão do mercado. Na época, em uma entrevista ao Brasil Econômico, Michael Lee, diretor de marketing global e de desenvolvimento de negócios do Alibaba afirmou que o Brasil é um país chave, pelo fato de concentrar 7 milhões de pequenas e médias empresas e por ser o centro do comércio para os países da América Latina. “Em longo prazo, nosso objetivo é usar o Brasil como uma plataforma para a nossa expansão em outros países da região”, disse.

Falsificações também trouxeram problemas na China

Mais que um ponto crítico no exterior, as suspeitas de venda de produtos falsificados já trouxeram reflexos também no mercado chinês. Em janeiro, a Administração Pública de Indústria e Comércio da China afirmou que a empresa vivia uma “crise de credibilidade” pelo fato de não conseguir reprimir essas ações. Em outra frente, a varejista francesa de cosméticos Sephora fechou contrato com a principal rival doméstica do Alibaba, a JD.com, para instalar sua primeira loja virtual no país. No anúncio, a Sephora fez questão de ressaltar que com a parceria, seria capaz de fornecer aos consumidores locais “uma experiência de compra on-line verdadeiramente de classe mundial, sem a preocupação com falsificações”.

Em comunicado enviado ao Brasil Econômico, o Alibaba afirmou que continua a trabalhar com diversas marcas para ajudá-las a proteger suas propriedades intelectuais e que tem um forte histórico de iniciativas desse porte. A companhia também comentou especificamente o caso envolvendo o grupo Kering. “Infelizmente, o grupo Kering escolheu o caminho do processo ao invés do caminho da cooperação construtiva. Nós acreditamos que essa acusação não tem fundamento e vamos lugar vigorosamente”, afirmou.

À parte desse debate, o Alibaba está investindo em uma nova tecnologia para reforçar as barreiras e reduzir os riscos de falsificações. Com base nas plataformas da Visualead, empresa israelense que recebeu investimento do grupo chinês em janeiro, a tecnologia inclui recursos com QR Codes, que permitem aos vendedores gerar um código de segurança para cada item disponível nas plataformas, além de um aplicativo pelo qual é possível comprovar a autenticidade do produto.

O grupo também afirma que não vem medindo esforços para combater as falsificações. Recentemente, a empresa divulgou um relatório afirmando que investiu US$ 160,7 milhões nessa frente, entre o início de 2013 e novembro de 2014. O aporte incluiu iniciativas como a montagem de uma equipe de 2 mil pessoas dedicada exclusivamente ao monitoramento dessas ações, com o auxílio de cerca de 5,4 mil voluntários, o que inclui vendedores da plataforma. Ao mesmo tempo, o Alibaba afirmou que, até setembro, cooperou com mais de 1,1 mil empresas para identificar e remover produtos que infringiam questões de propriedade intelectual de suas plataformas. Em investigações em parcerias com órgãos chineses, 404 suspeitos de envolvimento de falsificação de produtos de marcas como Nike, Prada e Chanel foram presos, enquanto 200 lojas foram fechadas. Como resultado dessa e de outras ações, a companhia disse que hoje um índice de 3,5 a cada 10 mil transações recebem reclamações dos compradores, uma queda de 22% na comparação anual. Com agências

Vendas mais fracas e crise de confiança

As falsificações são apenas um componente de um cenário que levou o Alibaba a perder cerca de US$ 90 bilhões em valor de mercado nos últimos seis meses, sob a desconfiança do mercado quanto ao potencial da companhia para manter o fôlego e a atração demonstrada em seus primeiros meses pós-IPO. Entre outros fatores, o pacote inclui a desaceleração da economia chinesa e a rápida migração dos consumidores para as transações via dispositivos móveis, menos lucrativas na comparação com os negócios realizados via PCs. Outro elemento foi o anúncio feito pelo fundador e presidente do conselho, o bilionário Jack Ma, de que a empresa ia congelar as contratações no grupo. Um fator adicional é a participação ainda modesta das receitas internacionais nas vendas totais da companhia. Segundo postagem do executivo no Twitter oficial do Alibaba, em março, as vendas fora do mercado chinês respondem hoje por menos de 5% da receita da empresa.

Na esteira desse contexto, o Alibaba nomeou no início do mês Daniel Zhang como novo executivo-chefe, em substituição a Jonathan Lu, que estava no cargo há dois anos e foi mantido como vice-presidente do conselho da companhia. O anúncio foi realizado juntamente com os resultados do ano fiscal 2015, encerrado em 31 de março. No último trimestre fiscal, o grupo apurou uma receita de US$ 2,81 bilhões, alta de 45% sobre o mesmo intervalo do exercício anterior. O desempenho e a nova liderança voltaram a dar indícios de uma recuperação. Ontem as ações da companhia fecharam o pregão em Nova York cotadas a US$ 90,47. No início do mês, os papéis chegaram a ser negociadas a US$ 79, o mais baixo patamar desde a oferta pública inicial de ações da empresa e comparado a uma média de US$ 119, em novembro.

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