Por bruno.dutra

Rio - No mercado há cinco anos, Robson Vergílio já foi produtor de cerveja, desenvolveu um kit para a fabricação caseira e, hoje, dedica-se ao design de rótulos. Tudo começou, claro, com o gosto pela bebida. “É difícil dissociar a vida profissional dessa vida paralela, de apreciador e incentivador da produção artesanal”, diz ele, enquanto degusta a primeira garrafa da sexta-feira. Com 400 rótulos em seu portfólio, feitos para cervejarias de variados tamanhos, Vergílio é um exemplo dos profissionais que vêm aproveitando o crescimento do segmento de cervejas artesanais no Brasil para ganhar dinheiro.

É um mercado que vem atraindo a atenção de gigantes do setor, como a fabricante de latas Rexam e a de garrafas Verallia. A primeira já tem contratos para rótulos de circulação nacional — como a Germânia, da New Age, a Colônia Pilsen, da Inab – Indústria Nacional de Bebidas, e a Dado Bier — e vê um movimento de sofisticação no mercado, com a adoção de inovações tecnológicas como o uso de tinta termocrômica, que faz a arte da lata mudar de cor quando a temperatura da bebida atinge os 8º C, adotada pela cerveja A Outra.

Mas é no pequeno fornecedor, geralmente um apreciador da bebida, que o segmento vem se consolidando. O sistema funciona quase como uma confraria, na qual parceiros de copo se tornam clientes ou sócios no processo. Os kits desenvolvidos por Vergílio, por exemplo, são vendidos pela Lamas Brew Shop, do amigo David Figueira, que também produz sua própria cerveja, além de abastecer outros fabricantes. “É um grupo que fomentava a cultura da cerveja pelo prazer, mas também esperando um retorno mais à frente”, comenta Vergílio.

O momento chegou: segundo a Associação Brasileira de Microcervejarias (Abracerva), são hoje 300 empresas no segmento — crescimento de 50% com relação há dois anos — com faturamento de cerca de R$ 2 bilhões por ano. Na lista, há desde as chamadas nanocervejarias, que têm abrangência local, até empresas de porte nacional, como a Cervejaria Colorado, que hoje produz 200 mil litros por mês e pode ser encontrada em boa parte dos supermercados e bares especializados do país. Todas, em maior ou menor grau, dependem de uma gama de fornecedores, que vão do importador de insumos ao fabricante de tampas.

“O crescimento é absurdo. Nossas vendas têm dobrado a cada ano”, comemora Wallace Ataíde, da distribuidora de garrafas, tampas e lacres Acquamineira, sediada em Belo Horizonte, um dos polos cervejeiros mais ativos do país, e com filial em Camaçari (BA). Sua empresa tem hoje 20 microcervejarias como clientes fixos — há 10 anos, eram três. Sem contar com os chamados home brewers, que produzem a bebida em casa apenas para degustação com amigos.

De olho nesse cenário, o Sebrae prepara o lançamento de um programa de capacitação de produtores, para ajudar os empreendedores a se adequarem às regras de comercialização da cerveja. Hoje, seis marcas já fazem parte do programa e a ideia é aproveitar o evento especializado Mondial de La Bierre, no final do mês, para atrair novas empresas. “Será feita uma avaliação de maturidade operacional e gerencial de cada empresa”, explica Lídia Espindola, da gerência de Programas Estratégicos do Sebrae RJ. Entidades do setor apontam ainda o crescimento de um novo tipo de produtor, a cervejaria cigana, que usa instalações de outras fabricantes para produzir suas marcas.

Com o desenvolvimento do mercado, porém, começam a surgir novos desafios. “Os meios de produção para o mercado de cervejas especiais precisam ser democratizados e estamos trabalhando para isso”, diz Marcelo Carneiro, presidente da Abracerva e da cervejaria Colorado. “A garrafa ainda é cara no Brasil e os pequenos fabricantes pagam um custo mais alto por unidade. Quem produz cerca de 20 mil litros por mês pode pagar até R$ 1,20 por unidade nas fabricantes de vidro. Já uma cervejaria como a Colorado, que produz 200 mil litros por mês, leva uma carreta de garrafas e o custo, nesse caso, pode ficar em torno de R$ 0,90 a unidade”, explica.

A carga tributária, que prejudica a competição com cervejas importadas, é outro gargalo apontado por Carneiro. Segundo ele, os impostos representam hoje 50% do custo total de uma cerveja especial. Fora a chegada de uma variedade de novos players, que descobriram o negócio nos últimos anos. “É um momento de aprendizado, todo mundo vai ter que se adaptar”, afirma Vergílio. “Mas acredito que conhecer muito bem o bebedor de cerveja artesanal é uma grande vantagem”, completa ele.

Importações crescem no Brasil, segundo dados do MDIC

As importações brasileiras de cerveja registraram aumento de janeiro a agosto deste ano. Dados do Sistema Aliceweb do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) mostram que no período foram importados 26.050.810 quilos (kg), contra 24.433.269 de janeiro a agosto de 2013. Fatores econômico, demográfico e cultural contribuem para a expansão desse mercado. A faixa etária entre 18 e 60 anos é a que consome bebidas alcoólicas, dos quais 70% serão economicamente ativos em cerca de dez anos, segundo estudos do mercado. E a cultura cervejeira vem se consolidando no país.

A Bélgica exportou 1.421.831 kg até agosto de 2014 contra 1.233.444 kg no mesmo período de 2013, sendo superada pelos Países Baixos (Holanda), cujas exportações para o Brasil aumentaram de 7.643.133 kg nos nove primeiros meses de 2013 para 9.922.960 kg em igual período deste ano; e Alemanha, que negociou 3.642.507 kg contra 2.913.642 kg no mesmo período.

O resultado representa uma recuperação do mercado, já que, em 2013, foi registrada uma queda nas importações em relação a 2012. O certo é que o mercado de cervejas especiais, premium e super premium permanece em alta com um crescimento médio de 15% ao ano. O consumo de cerveja no Brasil é de 64 litros per capita, dos quais 3,4 litros per capita são das cervejas gastronômicas, ditas especiais.
Eventos relacionados ao mercado de cervejas especiais estão se tornando um espaço para apreciadores conhecerem melhor as novidades do setor, dentro e fora do país. Nos dias 20 a 23, acontece a segunda edição do Mondial de La Bierre, no Rio. Serão mais de 60 expositores e e 600 rótulos de cervejas especiais do Brasil e de outros países. O encontro é realizado anualmente também em Montreal, no Canadá, e em Mulhouse, na França.

O Belgian Beer Weekend Rio, evento de cervejas belgas, acontece de 27 a 30 de novembro, no Centro Empresarial SulAmérica, na Cidade Nova. Assim como acontece há 16 anos em Bruxelas, o evento, feito em parceria com o governo da Bélgica, reunirá cerca de 40 cervejarias de diversas regiões e mais de 200 rótulos, muitos deles inéditos no Brasil.

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