Por monica.lima

Rio - Dona de uma carteira de encomendas de US$ 100 bilhões, a russa Rosatom avança em direção aos mercados de tratamento de água e medicina nuclear no país, a partir do escritório recém-inaugurado no Rio de Janeiro. Embora a montagem, a operação e o fornecimento de combustível para centrais nucleares continuem a ser seus principais negócios, a empresa vê potencial para atuar no país também em outros segmentos, como agricultura e maquinário pesado.

A empresa negocia com prefeituras brasileiras o uso de radiação para tratamento de água e, em fevereiro, uma subsidiária da Rosatom — a JSC Isotope — assinou contrato com a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN)para fornecer um isótopo utilizado na medicina nuclear. Além dessa vertente de negócios, o uso de radioatividade para preservar alimentos é outro mercado potencial fora do setor de energia que interessa à Rosatom, conta Kirill Komarov, CEO adjunto de Desenvolvimento Empresarial e Negócios Internacionais da companhia. “Para isso, abrimos o escritório regional no Brasil”, justifica o executivo, referindo-se à prospecção de oportunidades em outras áreas além da construção de centrais nucleares. A Rosatom também ergue usinas não nucleares e fornece equipamentos para esse tipo de central.

Com duas usinas nucleares em operação e uma terceira em construção, o Brasil reviu seus planos de construção de novas centrais a partir do acidente de Fukushima, em 2011, no Japão. “Foi um banho de água fria radioativa. Antes, o Plano Decenal de Energia previa a construção de cinco usinas nucleares num prazo de dez anos. Chegaram a ser feitos estudos de localização”, lembra Nivalde José de Castro, coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gedel), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Com o acidente de Fukushima, esses projetos saíram do planejamento do setor.”

No momento, a Rosatom espera pela volta das térmicas nucleares à pauta brasileira. “Estamos aguardando um convite do governo brasileiro”, diz Komarov, acrescentando que não teve encontros recentes com membros do governo para tratar do tema. Para marcar posição, a empresa — um grupo com cerca de 255 mil funcionários — acena com a bandeira do conteúdo nacional em futuros contratos. “Dependendo do modelo de negócio adotado, as usinas podem ter de 30% a 40% de conteúdo local. Isso vai depender de quantos projetos são construídos. Quanto mais, maior o percentual”, argumenta o presidente adjunto de Desenvolvimento Empresarial e Negócios Internacionais. Outro atrativo que a Rosatom está disposta a colocar na mesa de negociações é a forma de financiamento dos projetos.

Segundo Komarov, novas usinas poderiam ser financiadas tanto por meio de acordos entre os governos russo e brasileiro como por meio de investimento direto da Rosatom. Uma outra alternativa seria a construção a partir do capital de terceiros (investidores privados). No caso de um acordo fechado entre governos, o custo da energia gerada pelas novas centrais nucleares tenderia a ser mais barato, uma vez que este tipo de financiamento costuma ter juros menores. Já um projeto inteiramente custeado pela Rosatom geraria energia a um preço mais elevado, por incluir na conta final juros de mercado e uma dose maior de risco para a empresa. “Não existe projeto nuclear no mundo em que o governo não tenha participação. A construção de uma usina é demorada e requer um investimento alto. É um projeto no qual não se aplica somente a lógica comercial”, reconhece o executivo. Um dos argumentos em favor das centrais nucleares é o custo relativamente previsível da energia. Enquanto nas térmicas a gás e a carvão o combustível responde por 60% a 70% do custo da energia, nas usinas que geram energia a partir do urânio este percentual fica em 4%, no máximo. “Vamos precisar construir novas usinas nucleares para suprir a demanda nos próximos dez a 15 anos”, sustenta Nivalde Castro, da UFRJ. “Mais que uma política de governo, essa é uma decisão de Estado. Uma central dessas fica pronta em dez anos”. Nos últimos quatro anos, a Rosatom acrescentou ao seu portfólio US$ 80 bilhões em negócios de construção, fornecimento de combustível e serviços (operação).

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