Por diana.dantas

Há dois anos comecei a escrever esta coluna, e quero começar esta última oportunidade de falar com meus leitores agradecendo por ter podido, nesse tempo, acompanhar e refletir sobre as dores que passamos como consumidores e os avanços, que, mesmo com muita dificuldade, conquistamos. Nestes dois anos, saímos de uma época de bonança, de consumo fácil, passamos por um tempo de espera pelas eleições, para saber qual o rumo o país iria tomar, e estamos agora num período de recessão e de incertezas sobre a retomada econômica. A crise, que vem fechando empresas e diminuindo bastante o ritmo de outras, é a oportunidade para se rever e acabar com processos viciosos e inúteis, para se pensar criativamente e privilegiar a eficiência, a qualidade, sair do modelo de metas numéricas, buscar transparência e honestidade nas relações. É isto que o consumidor, e o cidadão brasileiro, quer.

Para tentar fazer um balanço destes dois anos de coluna, dei uma passeada nos temas sobre os quais escrevi e reparei que o fio condutor que perpassa todos os temas é a questão da falta de clareza em tudo: nas ofertas, na entrega dos serviços, nas relações com o cliente. Quase uma sequência de causas e efeitos. Começa pelas pegadinhas nas ofertas, que levam o consumidor a comprar errado; para comprar, o consumidor tem que disponibilizar seus dados e não sabe como a empresa vai usá-los; como a oferta é enganosa, e o serviço ou o produto não corresponde ao que se comprou, aparecem as cobranças indevidas; o atendimento ao cliente mais enrola do que soluciona. Irritado, o consumidor busca solução nos procons e na internet; se, na confusão, ficar inadimplente, vai sentir o gosto amargo dos juros e às vezes é tão difícil resolver que é necessário buscar a Justiça, que, de tão lenta, vem ficando cada vez mais injusta.

Escrevi sobre todos esses temas dessa corrente maligna. Mas também sobre outros, como a crise da energia elétrica e as bandas tarifárias, a falência dos planos de saúde e a falta de confiança no sistema de saúde suplementar, os problemas eternos da área de telecomunicações, a difícil e ineficiente fiscalização das agências reguladoras, a oferta irresponsável de crédito e o superendividamento. Também mandei recados para os novos governantes, sobre o que queríamos, cidadãos e consumidores, como prioridades nas políticas públicas.

Mas, confesso, gostei imensamente de tocar em três temas. O primeiro foi sobre a minha paixão particular, o campismo, e mais especificamente, sobre minhas andanças de motor home pelo país. Compartilhei os problemas nas estradas e a cobrança dos pedágios, um dos mais caros do mundo, a comparação da qualidade dos serviços em outras regiões do país, como o Sul e o Centro Oeste, e avisei ao governo estadual que nossos hermanos viriam de motor home para a Copa, mas ninguém deu bola, e deu no que deu, um vergonhoso improviso.

O segundo tema foi ter compartilhado a minha viagem ao Japão. Falar do atendimento do japonês, da cordialidade, da determinação em ajudar, mas, principalmente, da eficácia do treinamento. Não é por acaso que eles são tão bons. Eles treinam, estudam, estão comprometidos com a eficiência, que é um valor de vida, não uma circunstância do trabalho. Estão focados no bem da outra pessoa. Um povo que conversa baixo para não incomodar o vizinho, que carrega seu lixo até achar uma lixeira. Amei o Japão.

O terceiro e mais importante tema foi o cidadão como consumidor de políticas públicas. Quando incorporarmos a ideia de que o que é público é de todos nós, que são os nossos impostos que pagam os serviços de educação, saúde e segurança pública, vamos aprender a cobrar, e vamos usar mais. E se o serviço público for bom, o teremos como opção ao privado, e aí, tenho certeza de que as empresas vão se esmerar mais em atender melhor.

Revendo as colunas e pensando quais os avanços que poderia destacar, ri sozinha ao ver uma das minhas primeiras colunas na qual eu perguntava por que os fabricantes de cafeteiras não combinavam com os fabricantes de filtro de café o tamanho certo do filtro e, hoje, folgo em dizer, já vejo algumas embalagens de filtros de café que trazem a lista das cafeteiras ideais para o filtro. Sim, tivemos outros avanços. A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), do Ministério da Justiça, colocou no ar o site consumidor.gov.br, um novo canal de solução online com as empresas. Este ano o Código de Defesa do Consumidor faz 25 anos e a Senacon vai sediar o encontro mundial da Consumers International. Estamos na luta.

Mas, nesta altura da crise, minha opinião é que precisamos nos levantar só. Não dá para contar com ninguém. Estamos reféns de um péssimo Congresso, recheado de políticos que estão preocupados apenas em manter ou melhorar os benefícios da classe e arrumar cargos. Praticamente todas as grandes empresas do Brasil estão citadas em alguma operação, envolvidas com alguma falsa doação às campanhas eleitorais. A crise moral é tão grande ou maior do que a crise econômica no Brasil.

O consumidor, neste momento, está retraído, espremido entre o medo do desemprego e a luta para fazer o dinheiro cobrir as despesas, que aumentam assustadoramente. Estes dois anos foram de aprendizado de novos tempos, de reclamar nas ruas, de dar mais atenção à economia, de apertar o cinto, mas também é de novos tempos na reflexão sobre a economia da água e da energia, da forma como consumimos, do que fazemos com o nosso lixo, do que queremos melhorar. O país está vivendo a maturidade das relações de consumo. É hora de avançar. E nós, consumidores e cidadãos, vamos em frente, consumindo com mais critério, exigindo mais, cobrando mais. Gostaríamos muito que as empresas compartilhassem este avanço conosco, privilegiando a clareza, a boa fé e a eficiência. Obrigada pela leitura e até a próxima oportunidade de estarmos juntos.

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