Nicole, Renatinho e Pedro de Luna: premiação para novos talentos na Box 35Arquivo Pessoal

Niterói – A saudosa casa noturna Box 35 fez história e grande sucesso nos anos 2000 na cidade de Niterói, assim como sua mais famosa antecessora, a boate Madame Kaos, no final dos anos 90.

Sendo que, no caso da Box 35, tratava-se de um sonho de uma produtora independente e hoje advogada, Nicole Blass, que virou realidade devido aos seus esforços e parcerias estratégicas -- entre elas com o precursor da noite LGBT da cidade, Ricardo Lauria, empresário e dono da Vollúpya. A Madame Kaos já era pilotada por profissionais da noite, que tinham feito muito sucesso com outras casas noturnas bem menos alternativas, como o Le Village e a República das Bananas, e isso lhes dava poderes financeiros para ousar e tentar algo diferente.

A Box 35 conseguiu reunir o público local que frequentava a Vollúpya, a Cantareira, os shows de rock e as festas universitárias – além de trazer público do Rio, interessado em conhecer novos DJ’s que ali tocavam (Arley, Ed Rose, Sudano e Juan) e shows de novas bandas, ali acolhidas para mostrar seu som autoral – como era o caso das bandas Coyote Valvulado, Besouros Verdes e até a Zarapatéu, primeira banda do Chicão, filho da Cassia Eller. Francisco cantava e tocava percussão nesta banda formada somente por alunos do Centro Educacional Anísio Teixeira (CEAT), entre eles Bruna Araújo, filha da cantora e atriz Emanuelle Araújo.

O público alternativo criava o ambiente de uma noite bem democrática, onde se sentiam bem desde os roqueiros radicais até às drag queens que se montavam para fazer shows. Também era uma casa que valoriza a qualidade dos DJ’s e, por isso, sempre se ouvia nas pistas reggae, rock nacional e internacional seja clássico ou atual, bandas independentes ainda em fase de crescimento e até uma voz e violão mais ousada, com repertório “de sapatão” entre os sucessos da MPB.

O professor e artista plástico Gustavo Duarte, da Plus Ultra – produtora com propostas modernas e retrô, também muito conhecida na cidade já naquela época – disse que a Box 35 era uma mistura de tudo, mas dava certo. “Lembro que a Box 35 era um lugar bem democrático, onde a gente podia encontrar pessoas de qualquer tribo. Tinha techno, rock, reggae. As pessoas eram pacíficas”, conta Gustavo, dizendo que, apesar de existir segurança, praticamente não se precisava destes profissionais. Não rolavam brigas.

A frequência da Box 35 era composta por artistas como Black Alien e Speed Freaks, além de outros rappers e MCs da cidade, todos misturados aos integrantes do Arariboia Rock, movimento de música pilotado pelo jornalista e escritor Pedro de Luna. O saudoso vereador do Psol, Renatinho do Pano de Prato, chegou a apoiar oficialmente o movimento, em 2011, oferecendo a alguns integrantes a Moção de Aplauso da Câmara Municipal de Niterói.

“Considero que possibilitei e abri as portas para quem desejava produzir, criar e se apresentar na Box 35. Era desde as bandas alternativas e autorais, aliás, essa era a nossa prioridade porque afinal de contas bandas autorais sempre tiveram dificuldade para achar um local que abraçasse essa ideia, mas a minha prioridade era justamente lançar novas bandas e novos projetos”, disse Nicole Blass.

Sobre a noite LGBT em Niterói, ela acrescenta: “A sociedade hoje sabe, ainda que tenha muita gente lgbtfóbica, que é crime proibir, agredir e impedir as pessoas nos espaços comuns. Na contramão do Rio de Janeiro, onde várias casas e espaços LGBTs são criados e dão certo, aqui em Niterói temos falta de incentivo e falta de apoio para criação desses espaços, temos a centralização da visibilidade LGBT por um grupo que tem interesses eleitoreiros e acreditam que só eles podem comandar a pauta, eles se apropriam e desestimulam a cultura da diversidade, embora falem que são os grandes incentivadores. É como se precisassem do aval desses grupos para ser legitimo qualquer movimento que não seja filiado a esse movimento, que por sinal está antigo e deveria rever sua postura”, observa a advogada.
A NOITE VIROU SÓ BARZINHOS?

Hoje a diversão noturna da juventude não passa mais pela pista de dança – costuma ser na mesa de bares da cidade, onde passam jogos de futebol ou shows de sertanejos nas TVs. Pessoas se reúnem para bater papo e beber, raramente para dançar. Agora os DJ’s de pista estão mais concentrados em festas em clubes e casas.

Falando sobre o segmento LGBT da noite, Niterói possui apenas um bar “assumido”, que é o Armazém 7, no Ingá. E um novo tipo de espaço surgiu, mas que não valoriza o orgulho LGBT – que são os ‘cruiser bar’ – que são espaços disfarçados de sex shop, mas com bar e salas escuras para sexo ocasional. “Isso diz muito sobre ser quem a gente é! Se os frequentadores são casados, se escondem, buscam apenas algo rápido, é por que a família e a sociedade são os opressores e responsáveis pela perseguição e discriminação dessas pessoas. Sair do armário não é pra todos. Tem pessoas que não podem e não conseguem se assumir e não tem nenhum orgulho da sua sexualidade, elas próprias se consideram desviantes por conta de a sociedade impor a heterossexualidade compulsórias. Que triste isso. Sabemos que isso causa sofrimento e depressão”, diz a advogada e produtora cultural Nicole Blass, ela mesma mãe, lésbica e ativista.