Buenos Aires (Argentina) – A Bolívia aguarda explicações oficiais do Brasil sobre a operação que resultou na saída do senador boliviano Roger Pinto Molina, com o apoio de funcionários da embaixada brasileira em La Paz, e na saída do chanceler Antônio Patriota. “Soubemos da saída de Patriota pela imprensa e preferimos esperar as informações do governo brasileiro sobre esse episódio, que violou as normas da Bolívia, do Brasil e internacionais”, disse a ministra da Comunicação da Bolívia, Amanda Davila.
Líder do partido de oposição Convergência Nacional, Molina é denunciado em pelo menos 20 processos por desacato, venda de bens do Estado e corrupção. Ha 15 meses, ele refugiou-se na embaixada brasileira em La Paz, alegando ser perseguido político, depois de fazer denúncias de corrupção contra o governo Evo Morales. O governo brasileiro lhe concedeu asilo político em maio de 2012, mas para sair do país, o senador precisaria de um salvo-conduto (autorização) – que o governo boliviano negou.
“Não podemos dar salvo-conduto para uma pessoa que foi condenada pela Justiça e que está sendo investigada por participação no massacre de 13 indígenas, na província de Pando, em 2008”, explicou Davila. Segundo ela, Molina só recebeu asilo na embaixada brasileira porque o então embaixador Marcel Biato e o encarregado de negócios Eduardo Saboia “deram ao governo de Dilma Rousseff uma informação incompleta” sobre a situação do senador, “que conta com o apoio de forças políticas e conservadoras, tanto na Bolívia quanto no Brasil”.
Depois de passar 454 dias trancado na embaixada brasileira, Pinto Molina chegou a Corumbá (MS) no último sábado, dia 24. Para chegar lá, ele teve que fazer uma viagem de 22 horas, em um carro da Embaixada do Brasil, escoltado por fuzileiros navais. Segundo o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, ao cruzar a fronteira boliviana, foi recebido por agentes da Policia Federal e seguiu para Brasília de avião.
O diplomata brasileiro Eduardo Saboia – que estava como encarregado de negócios na embaixada em La Paz depois da saída de Biato - assumiu a responsabilidade pela operação. Ele disse que tomou a decisão de tirar o senador do país porque “havia risco iminente à vida” dele. Molina – que há mais de um ano vivia em espaço de 20 metros quadrados, longe da mulher, dos três filhos e quatro netos - já teria ameaçado suicidar-se.
“Achamos estranho que ele estivesse correndo risco de vida e estivesse em condições de viajar de carro, encontrar-se com amigos e fazer declarações à imprensa”, disse Davila. “Devo agradecer, uma vez mais, às autoridades do Brasil”, disse o senador ao chegar em Brasília, onde ficou hospedado na casa do senador Ferraço.
Para Davila, o caso de Pinto Molina não é comparável ao do australiano Julian Assange, fundador do site "Wikileaks", que revelou documentos secretos de mais de um governo. Ele pediu asilo político ao Equador e está escondido na embaixada equatoriana em Londres, desde 19 de junho de 2012. O governo britânico nega o salvo-conduto porque Assange está sendo buscado pela Justiça sueca, para responder a acusações de agressão sexual.
“No caso de Assange, é óbvio que as acusações foram pretexto para prendê-lo e fazê-lo calar. Ninguém resolve dizer que foi estuprado cinco anos depois”, disse Davila. Ela prefere comparar o caso de Molina ao do ex-ditador boliviano Luis Garcia Meza, que fugiu para o Brasil. Acusado de violações de direitos humanos e tráfico de drogas, ele foi extraditado para a Bolivia em 1995 e condenado a 30 anos de cadeia.
Davila negou versões que circulam em Brasília de que setores do governo boliviano teriam sugerido aos diplomatas brasileiros em La Paz terminar com o impasse e levar o senador ao Brasil por conta e risco próprios – mas com a garantia de que não seriam interceptados por autoridades da Bolívia. “Impossível. O senador está sendo buscado pela Justica para prestar depoimento sobre eventual participação no massacre de Pando”, disse ela.