Por paloma.savedra

Rio - O Ministério Público Federal (MPF) do Rio de Janeiro recorreu contra a decisão judicial da 17ª Vara Federal do Rio, que negou o pedido de retirada de vídeos veiculados no YouTube, considerados ofensivos ao candomblé e umbanda, e ainda desconsiderou que as manifestações religiosas afro-brasileiras como religiões.

De acordo com o MPF, a decisão fere a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Declaração Universal Pacto Internacional Sobre os Direitos Civis e Políticos, a Declaração Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Intolerância e Discriminação Fundadas na Religião ou nas Convicções e a Convenção Americana dos Direitos Humanos, assim como a Constituição Federal e a a Lei 12.288/10.

Procurador responsável pelo caso, Jaime Mitropoulo interpôs agravo de instrumento, para a reconsideração da decisão e pede, em caráter liminar, a retirada imediata dos vídeos que incentivariam a intolerância com as religiões de matrizes africanas.

"Repudiamos veementemente a posição da Google Brasil, já que o Ministério Público Federal compreende que mensagens que transmitem discursos do ódio não são a verdadeira face do povo brasileiro e tampouco representam a liberdade religiosa no Brasil. Esses vídeos são exceções e como exceções merecem ser tratados. O povo brasileiro não comunga com a intolerância religiosa. Em sua esmagadora maioria, muito pelo contrário, ele cultiva o respeito religioso. Mesmo quem não compartilha das crenças religiosas alheias as respeita”, declarou o procurador.

Investigação

A atuação do MPF é resultado de uma investigação instaurada a partir de uma representação da Associação Nacional de Mídia Afro, que levou ao conhecimento da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão vídeos publicados no YouTube que estariam disseminando o preconceito, a intolerância e a discriminação a religiões de matriz africana.

No começo do ano, o MPF expediu recomendação para que o Google do Brasil retirasse os vídeos. Entretanto, em resposta, a empresa se negou a atender a orientação, dizendo que o material divulgado "nada mais seria do que a manifestação da liberdade religiosa do povo brasileiro" e que "os vídeos discutidos não violariam as políticas da companhia".

Segundo o MPF, as mensagens veiculadas fazem apologia e incentivam discursos de ódio, preconceito, intolerância e de discriminação. Esses conteúdos pretendem estabelecer que há uma indissociável ligação do “mal”, do “demônio” ou de uma indigitada “legião de demônios” com as manifestações religiosas de matrizes africanas.

"Pensamento de juiz é preconceituoso", diz representante de religião afro-brasileira

Interlocutor da Comissão de Intolerância Religiosa, o babalorixá Ivanir dos Santos definiu como "um pensamento absolutamente preconceituoso" a decisão do juiz federal Eugenio Rosa de Araujo de desconsiderar os cultos africanos como religião.

"Como um juiz de um estado laico coloca um pensamento que é absolutamente preconceituoso? É triste ver um magistrado agir com total desconhecimento sobre o que são as religiões afro-brasileiras", disse o babalaô. "Todas as religiões de matrizes africanas têm um Deus. Eu lamento que que ele queira impor uma visão de religião que nem o Estado se predispõe a discutir", completou.

Segundo o sacerdote do candomblé, o argumento da não existência de um livro base para a religião contraria até a tradição do Cristianismo. "O Antigo Testamento, o Torá, vem de uma tradição oral. Muito tempo depois essa tradição foi registrada em escrita. Ao tomar tal decisão, o juiz ofendeu o próprio Cristo, que não deixou nada escrito", declarou.

Para ele, a sentença do juiz federal esbarra na Constituição, que prevê o direito à liberdade de expressão. "Ele tem muito mais a opinião de uma pessoa preconceituosa do que a de um magistrado. Essa decisão fere a Constituição Brasileira. É um total desrespeito à liberdade de culto.

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