Por bferreira
Rio - “A corrupção, como todos os pecados, está entranhada na alma humana. Não é exclusividade de um ou outro partido, de uma ou outra instituição. Trata-se de um fenômeno muito mais complexo e resiliente. Estamos purgando, hoje, males que carregamos há séculos”. Pode parecer pregação aleatória de um pastor evangélico zangado com a Humanidade, mas não é. Trata-se de trecho do discurso da presidenta Dilma Rousseff ao receber das mãos do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o diploma para o exercício do seu segundo mandato. De acordo com o mesmo fio de raciocínio, ela afirmou que “chegou a hora de firmarmos um pacto nacional contra a corrupção, envolvendo todos os setores da sociedade e todas as esferas de governo”. Na visão de Dilma, “esse pacto vai desaguar na grande reforma política que o Brasil precisa promover a partir do próximo ano”.
Por mais que o momento seja de boa vontade e de espírito natalino, confesso que a declaração da presidenta Dilma ficou entalada na minha garganta. Acho que não é hora de considerações bíblicas ou filosóficas a respeito da corrupção. Muito menos de citações do tipo “o homem é bom por natureza, mas a sociedade o corrompe” (Rousseau). O que estamos vendo nos últimos tempos no Brasil são casos clamorosos de corrupção no Executivo e no Legislativo que nada têm a ver com a fatalidade ou com as fraquezas inerentes ao ser humano.
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Ao contrário do que a generalização feita por Dilma dá a entender, não vivemos num país de gente corruptível. De forma alguma. A corrupção é, sim, praticada por uma audaciosa minoria, aboletada em cargos públicos e protegida por mandatos políticos. Com a devida licença da presidenta, a corrupção não está entranhada na alma dos brasileiros. Está entranhada, sim, no Congresso e na administração pública. Talvez o mal venha desde os tempos da rainha Maria I. Mas poucas vezes se viu tanta desfaçatez.
Como disse o ministro Jorge Hage, da Corregedoria Geral da República, a respeito da compra da refinaria de Pasadena, que deu prejuízo de US$ 659 milhões à Petrobras, o que houve ali não foi um mau negócio ou erro de gestão. “Houve má-fé, mesmo”. Portanto, foram cometidos crimes já tipificados e passíveis de cadeia. Para combater os desvios de recursos públicos, seja na Petrobras seja em prefeituras, não é necessário debater pactos nacionais ou discutir medidas emergenciais. Basta aplicar com mão pesada o que está previsto na legislação em vigor. E é exatamente isso que estão fazendo os procuradores do Ministério Público Federal, o juiz Sérgio Moro e o ministro do STF, Teori Zavascki, com base nas investigações da Polícia Federal.
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Não há qualquer necessidade de criar grupos de trabalho e muito menos de envolver toda a sociedade e todas as esferas de governo no debate sobre as raízes da corrupção. O caso Petrobras está em boas mãos e deve ter seu desfecho em prazo bem mais curto do que o mensalão. Basta deixar que a Justiça siga o seu caminho. Que valha a advertência de Moro em artigo escrito em 2004 sobre a Operação Mãos Limpas na Itália (bem lembrado ontem por Elio Gaspari): “Um Judiciário independente, tanto de pressões externas, como internas, é condição necessária para suportar ações dessa espécie. Entretanto, a opinião pública, como ilustra o exemplo italiano, é também essencial para o êxito da ação judicial”.
Todo apoio ao juiz Sérgio Moro. E Feliz Natal!