Por clarissa.sardenberg

Ceará - Um ex-soldado da Polícia Militar revelou nesta semana o "assédio moral" que acontece em treinamentos da corporação e como a cultura militar " é uma espécie de religião que cria fanáticos". Em entrevista ao "El País", Darlan Menezes Abrantes revelou o medo que sentia de oficiais e o despreparo para lidar com as pessoas nas ruas que o tipo de treinamento oferecido pela PM cria.

"O soldado é treinado pra ter medo de oficial e só. O treinamento era só mexer com o emocional, era para o cara sair do quartel igual a um pitbull, doido pra morder as pessoas. Como é que eu vou servir a sociedade desse jeito? É ridículo", falou Abrantes à publicação. "O policial tem que treinar o raciocínio rápido, a capacidade de tomar decisões. Hoje se treina um policial parece que está treinando um cachorro para uma rinha de rua”, destacou.

Darlan foi expulso da polícia do Ceará em janeiro de 2014 após publicar o livro "Militarismo: um sistema arcaico de segurança pública". Ele passou 13 anos na corporação. “Eu fui pra algumas universidades aqui de Fortaleza distribuir o livro e fiquei do lado de fora da Academia, eu fui interrogado e eu fiquei impedido de trabalhar na rua”, contou à publicação.

Ex-soldado Darlan Abrantes contou abusos do militarismo em livro Reprodução Facebook

Darlan passou sete meses no extinto Curso de Formação e Aperfeiçoamento de Praças da PM cearense. Ele contou que por começar a questionar ordens abusivas de superiores, ganhou o apelido de "Mazela", termo comum no Ceará para identificar alguém preguiçoso.

“Fiquei com essa fama no quartel”, contou ele. “É uma lavagem cerebral. O militarismo é uma espécie de religião que cria fanáticos. Ordem unida, leis militares, os regimentos e tal, aqueles gritos de guerra", disse.

Darlan fez críticas a pequenas regras militares que, segundo ele, atrapalham a vida do policial: "Essas coisinhas bestas que os policiais vão aprendendo, como arrumar direito a farda. Você pode ser preso se não tiver com um gorro ou chapéu na cabeça. Essas coisas que só atrapalham a vida dos policiais. Às vezes eu pegava um ônibus superlotado, chegava com a farda amassada e ficava sexta, sábado e domingo preso. Você imagina? Por causa de uma besteira dessas? Isso é ridículo”, declarou.

Uma pesquisa publicada em 2014 pela pelo Centro de Pesquisas Jurídicas Aplicadas (CPJA), da Escola de Direito da FGV de São Paulo, e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, revelou dados alarmantes.

Segundo a pesquisa, 82,7% dos entrevistados afirmaram ter formação máxima de um ano antes de exercer a função, 38,8% disseram que já foram vítima de tortura física ou psicológica no treinamento ou fora dele e 64,4% afirmam ter sido humilhados ou desrespeitados por superiores hierárquicos. Apesar disso, o assunto ainda é pouco discutido.

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