Rio - Na semana em que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), irá decidir sobre pedidos de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff, Luiz Werneck Vianna, um dos mais importantes cientistas sociais do Brasil, alerta: um dos perigos da atual crise política no país é o impacto que seus desdobramentos estão tendo na sociedade, com acirramento de posições, divergências e falta de confiança das pessoas.
O professor da PUC-RJ crê que a sociedade sofre, pois está “cercada de incertezas no grande pântano que se tornou o país”. Ele considera possível o debate sobre a saída da presidenta, mas diz que até agora “não apareceu nada que a comprometa”.
ODIA: O presidente Eduardo Cunha deve decidir nesta semana acerca dos pedidos de impeachment protolocados na Câmara. É uma saída possível para crise do país?
WERNECK VIANNA: A gente está em um momento cheio de névoa na nossa frente, é difícil enxergar a política. Mas precisa ver se a Câmara vai aceitar o impeachment, se o Eduardo Cunha vai levar isso adiante. Até agora não apareceu nada que efetivamente comprometa o mandato da Dilma. Tem o julgamento das contas no Tribunal de Contas da União (TCU), o julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por exemplo, mas até agora não tem nada.
Então é golpe?
Não é golpe. Impeachment está previsto na nossa Constituição. É algo perfeitamente assimilável pelas nossas instituições, elas estão maduras. Mas não sei se a nossa sociedade está; faz muito pouco tempo que vivemos um processo assim. O problema vai ser o dia após o impeachment, precisamos olhar por esse lado, para além da formalidade e da legalidade, porque o país, dividido como está, pode cair numa guerra de extremos. Se a sociedade se desequilibra, perdem tanto os que puxam mais para esquerda, tanto os mais para a direita.
Como essa crise na política, com sucessivos escândalos, somadas aos nítidos problemas econômicos, afeta a sociedade?
Vivemos em um pântano. Há um sofrimento grande de não sabermos o que vem por aí, como será o dia de amanhã. Isso leva a cólera, à desesperança, de não ter um caminho válido. Desde as eleições, vivemos entre extremos e, repito, isso é ruim para todo mundo. Há um clima generalizado de desconfiança na sociedade, nas relações entre as pessoas. É necessário uma coalização do que é saudável.
Qual o papel da presidenta Dilma nesse começo de mandato em crise?
Ela é uma figura muito errática. A cada dia ela escolhe um caminho, e o pior, sempre sem convicção. Ela não está certa, por exemplo, vide suas declarações, do ajuste fiscal anunciado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Um presidente da República precisa ter mais desenvoltura, mais poder de persuasão, firmeza. Ela tem muita dificuldade para reconstruir alianças, e tudo somado leva ao desastre que está sendo esse primeiro ano de mandato dela.
E o ex-presidente Lula? Ele ainda teria algo a contribuir para ajudar a presidenta?
O Lula não está ajudando em nada, e tem imagem suficiente para poder fazer algo. Mas não, fica estimulando movimentos para combater o ajuste que o governo do partido dele quer fazer. E diz que possui um outro caminho, que é necessário outra estratégia, mas não diz qual é a rota certa para o partido, não diz o que deve ser feito.
Em certo sentido, a crise política passa também pelo Judiciário. Há um certo protagonismo deste poder neste momento?
O impeachment não sairá do TCU ou do TSE. O pretexto para desencadear o processo pode sair dos tribunais, mas o encaminhamento é político. O Judiciário tem que atuar expurgando padrões que não são adequados, não são corretos.