Por cadu.bruno

Estados Unidos - Dois anos depois de atrelar seu futuro ao sistema operacional Windows Phone, a Nokia caiu nos braços da Microsoft, aceitando a venda de suas operações com celulares para a gigante norte-americana por 5,44 bilhões de euros (7,2 bilhões de dólares), num negócio que fez suas ações dispararem mais de 40% nesta terça-feira.

A Nokia, que vai continuar como fabricante de equipamentos para telecomunicações e detentora de patentes, já foi a maior empresa de celulares do mundo, mas acabou superada por Apple e Samsung no competitivo segmento de celulares inteligentes.

Stephen Elop (à esquerda)%2C CEO da Nokia%2C cumprimenta o colega da Microsoft%2C Steve Ballmer%2C durante o anúncio da aquisiçãoReuters

O presidente da Nokia, Stephen Elop, que dirigia a área de software para empresas da Microsoft antes de ingressar na Nokia em 2010, vai agora retornar para a companhia norte-americana como presidente de suas operações com dispositivos móveis.

Ele está sendo cotado como um possível substituto ao atual presidente-executivo da Microsoft, Steve Ballmer, que vai se aposentar e está tentando transformar a companhia em uma empresa de aparelhos e serviços, como a Apple, antes de deixar o comando.

"Está muito claro para mim que a racionalidade disto é o caminho certo para seguirmos em frente", disse Elop a jornalistas, apesar de acrescentar que sente "grande tristeza" sobre a operação.

Em três anos sob o comando de Elop, a Nokia viu sua participação de mercado encolher e o preço de sua ação recuar em meio à aposta dos investidores de que sua estratégia fracassaria.

Em 2011, depois de escrever um memorando que afirmava que a Nokia estava ficando para trás e não tinha tecnologia para acompanhar o mercado, Elop tomou uma decisão controversa de usar o sistema operacional da Microsoft para smartphones, o Windows Phone, no lugar da própria plataforma desenvolvida pela Nokia ou do sistema criado pelo Google, o Android, hoje líder de mercado.

A Nokia, que teve uma participação de 40% do mercado de celulares em 2007, agora tem 15%, com uma presença ainda menor em smartphones, de 3%.

Às 8h07 (horário de Brasília), as ações da Nokia disparavam 41,8%, com investidores que tinham alugado e vendido a ação ao apostarem em novas quedas de preços correndo para recomprarem os papéis para limitarem suas perdas. Apesar da alta, o valor da ação da Nokia, de 4,18 euros, é uma fração do pico atingido em 2000, a 65 euros.

Após os ganhos desta terça-feira, a Nokia é avaliada como valendo cerca de 15 bilhões de euros, também uma fração em relação ao auge da companhia, que já chegou a ter valor de mercado de 200 bilhões de euros.

Enquanto isso, as ações da Microsoft em Frankfurt recuavam mais de 2%.

VENDIDA POR UMA NINHARIA

A venda do negócio de celulares da Nokia não é a primeira reviravolta dramática da empresa em sua história de 148 anos. A companhia já vendeu de botas de borracha a televisores. Mas o anúncio da venda foi um duro golpe para o país natal da empresa, a Finlândia.

Para muitos finlandeses, o fato de um ex-executivo da Microsoft ter assumido o comando da Nokia, apostado o futuro da empresa em uma aliança com a gigante norte-americana, demitido dezenas de milhares de trabalhadores e entregue a companhia às mãos da Microsoft foi um tapa ao orgulho nacional.

"(O predecessor de Elop) Jorma Ollila trouxe um cavalo de Tróia para a Nokia", publicou o tabloide Ilta-Sanoma. Ollila transformou a Nokia em uma potência global, mas foi responsabilizado mais tarde por ter demorado muito para reconhecer a ameaça do iPhone da Apple e a revolução trazida pelo smartphone.

"Como finlandês, não posso gostar deste negócio. Ele encerra um capítulo da história da Nokia", disse Juha Varis, gerente de portfólio da Danske Capital. "Por outro lado, talvez tenha sido a última oportunidade de vendê-lo."

Varis foi um dos muitos investidores que criticaram a decisão de Elop de apostar o futuro da Nokia em smartphones baseados no sistema operacional da Microsoft, que foi elogiado em resenhas de tecnologia, mas nunca deslanchou entre os consumidores.

"Então, o resultado é: toda a divisão de celulares por 5 bilhões de euros. Isso é nada comparado com a história da empresa", disse Varis.

Outros finlandeses lamentaram o declínio da ex-líder de mercado. Alexander Stubb, ministro do Comércio Exterior e para Assuntos Europeus, disse em sua conta no Twitter: "Para muitos de nós, finlandeses, inclusive eu, os telefones da Nokia são parte de um ambiente no qual crescemos. Muitas primeiras reações ao negócio serão emocionais."

O novo presidente interino da Nokia Risto Siilasmaa pintou um quadro sobre o quão difícil foi a decisão de vender a empresa, afirmando que o conselho de administração da companhia, depois de ser contatado pela Microsoft no início do ano, se reuniu quase 50 vezes para explorar alternativas à venda.

A Nokia afirmou que espera que cerca de 32 mil funcionários, do total de 90 mil trabalhadores da empresa no mundo, sejam transferidos para a Microsoft, incluindo cerca de 4.700 na Finlândia.

VENDA URGENTE

O preço do negócio de telefonia móvel da Nokia, fechado a cerca de um quarto das vendas da companhia no ano passado, representou um "nível de venda urgente", segundo o analista Tero Kuittinen, da consultoria Alekstra, embora outros discordem dessa visão.

"O que deve ser pago por um negócio em declínio, no qual a fatia de mercado tem sido constantemente perdida e a rentabilidade tem sido fraca?", disse Hannu Rauhala, analista do Pohjola Bank. "É difícil dizer se é barato ou caro."

A Nokia ainda é a segunda maior fabricante de celulares do mundo, atrás da Samsung, mas não está entre as cinco primeiras no mercado de smartphones, que é mais lucrativo e tem crescimento mais rápido.

As vendas da linha Lumia da Nokia têm ajudado o Windows Phone a ganhar participação no mercado global de celulares, alcançando uma fatia de 3,3%, de acordo com a consultoria Gartner, ultrapassando a BlackBerry pela primeira vez este ano. Ainda assim, o Android, do Google, e o sistema iOS, da Apple, respondem por 90% do mercado.

A Nokia disse em um comunicado que espera que, além de Elop, executivos do alto escalão como Jo Harlow, Juha Putkiranta, Timo Toikkanen e Chris Weber sejam transferidos para a Microsoft após o negócio ser concluído, sem especificar quais papéis teriam na empresa.

O presidente do conselho da Nokia, Risto Siilasmaa, assumirá os deveres de presidente-executivo enquanto a companhia finlandesa procura uma pessoa para o cargo, acrescentou o comunicado.

A venda da divisão de celulares da Nokia para a Microsoft deve ser concluída no primeiro trimestre de 2014 e está sujeita à aprovação por acionistas da Nokia e autoridades.

MOMENTO CRUCIAL

O negócio também marca um momento crucial para a Microsoft, que ainda gera grandes receitas a partir do seu sistema operacional Windows, com o pacote Office, de softwares de uso corporativo, e com o videogame X Box, mas nunca conseguiu montar um negócio rentável em dispositivos móveis. O aparelho portátil da Microsoft, o tablet Surface, tem registrado vendas fracas desde que foi lançado no ano passado.

"É um passo ousado em direção ao futuro --uma vitória para os funcionários, acionistas e consumidores de ambas as empresas", disse Ballmer em comunicado.

"Unir esses grandes times vai acelerar ações e os lucros da Microsoft em telefones e fortalecer as oportunidades globais para a Microsoft e nossos parceiros em toda a nossa família de dispositivos e serviços."

A investida deixa a empresa finlandesa com a Nokia Solutions and Networks, que compete com empresas como Ericson e Huawei em equipamentos para redes de telecomunicações. A Nokia também permanece com negócios em mapas e navegação por satélite e um amplo portfólio de patentes, que serão licenciadas para a Microsoft.

O negócio com a Nokia empurra a Microsoft adiante no disputado mercado de celulares, apesar de alguns investidores pedirem que a companhia se atenha aos softwares e serviços, negócios em que é mais forte.

Elop vai voltar para a Microsoft num momento em que o conselho da Microsoft avalia um sucessor para Ballmer, o que deve ser decidido nos próximos 12 meses.

"A Microsoft não pode abandonar os smartphones e a expectativa de que outros fabricantes possam adotar o Windows Phone está se esvaindo rapidamente. Então, a compra da Nokia acontece no momento certo", disse Carolina Milanesi, da empresa de pesquisa de mercado Gartner.

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