Por karilayn.areias

Rio - A compra da cervejaria Colorado pela gigante Ambev, no início do mês, chama a atenção para o crescimento do mercado de cervejas especiais no país. A produção dessas bebidas começou como hobby para muitos, que buscavam criar e experimentar novas combinações e sabores. Hoje, no entanto, é um segmento consolidado, com público fiel e entrada nos bares e restaurantes mais conceituados. Razões suficientes para atrair os grandes fabricantes.

Gilson Val criou a Jeffrey com os amigos Eduardo Brand%2C Raphael Ploise e Renato Monteiro%2C após os quatro voltarem de uma viagem à Bélgica. “Trouxemos cervejas e issoBruno de Lima / Agência O Dia

Hoje, no Brasil, as cervejas especiais respondem por 5% a 6% das vendas totais do mercado. Há cinco anos, o número era de 1,5% a 2%, segundo o Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe) da Receita Federal.

A Ambev já havia anunciado no começo do ano a compra da microcervejaria Wäls, de Minas Gerais. Em 2007, a Baden Baden foi comprada pela Schincariol, que por sua vez foi adquirida pela Brasil Kirin. Ou seja, essa não é uma história nova, mas é uma nova história, como diz o professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) Antonio Carlos Morim.

Ele afirma que a aquisição de cervejarias menores é uma necessidade das grandes produtoras para ganhar mercado. “Ou essas companhias incorporam produtos de alta qualidade ou precisam desenvolvê-los. É mais fácil comprar uma empresa que já é reconhecida, já teve crescimento acima do mercado”, explica.

Na ocasião do anúncio da união entre a Colorado e a Cervejaria Bohemia, a Ambev informou que pretende, com isso, colocar o Brasil no rol das escolas cervejeiras mundiais, ao lado das tradicionais belga, alemã, inglesa e americana. Segundo a companhia, o fundador da Colorado, Marcelo Carneiro, continuará à frente da marca, “se dedicando, principalmente, à inovação e busca por novas receitas e sabores”. Além disso, os funcionários continuam no quadro da empresa, que tem faturamento anual de R$ 18 milhões.

O objetivo com a união é aumentar a força de distribuição da Colorado, que continuará com a fabricação em Ribeirão Preto, interior de São Paulo.

Gabriel Di Martino%3A 'É uma mudança de cultura. Muita gente fala que cerveja especial é moda%2C mas eu vejo como uma tendência de mercado'Divulgação

Apesar dos receios de que a mudança afete a fórmula e a qualidade da Colorado, é pouco provável que isso ocorra realmente. Cervejeiro da Vila St. Gallen, onde é produzia a Terezópolis, Gabriel Di Martino afirma que o público é exigente, o que ajuda a manter o nível da cerveja.

“A gente sempre fica receoso com a perda de qualidade, visando quantidade.Mas a Colorado tem uma fidelização de clientes visível. Se muda a fórmula, as pessoas sentem e deixam de consumir”, explica.

Segundo a Ambev, todas as receitas serão mantidas, o que muda é a distribuição, que será ampliada.

Mudança de cultura estimula novo consumo

O consumo dos brasileiros mudou muito nos últimos anos no que se refere a cervejas. Marcas premium, como Stella Artois e Heineken, já são amplamente consumidas, enquanto cervejas especiais como as nacionais Colorado, Coruja, e outras estrangeiras, também são degustadas e até mesmo harmonizadas com pratos. “Essas cervejas entraram no mundo gourmet”, avalia Antonio Carlos Morim, da ESPM.

E uma das principais representantes desse segmento no Rio é a Jeffrey, que tem uma loja-conceito no Leblon. Atualmente é produzida na Serra Gaúcha, mas em breve ganhará uma fábrica própria em Petrópolis. Sócio da marca com mais três amigos, Gilson Val explica que há cada vez um interesse maior do público sobre esse universo cervejeiro.

“A Jeffrey foi construída em cima de gastronomia, música, arte. Nascemos nos melhores restaurantes, hoje estamos no Copacabana Palace. Mas ao mesmo tempo é possível encontrar a cerveja a bons preços. Nossa margem de lucro é baixa, mas a gente fez isso para que as pessoas possam comprar”, explica.

Para Gabriel Di Martino, cervejeiro da Vila St. Gallen, o apreço do brasileiro pelas cervejas especiais não é moda, é tendência. “Quando as pessoas começam a ter um poder aquisitivo maior, isso gera poder de experimentação que faz crescer as cervejarias”, ressalta.

E a vontade de conhecer mais é tanta que faz aumentar também o número de pessoas que produzem em casa, para consumo próprio. É o caso de Joarez Lessa, que com o amigo José Henrique Castro começou a fazer cervejas artesanais. Hoje dão aulas e fundaram uma confraria, a primeira de São Gonçalo, para reunir outros produtores. “Temos planos de lançar algo no mercado. Hoje é um hobby”, conta Lessa.

Pequenas fabricantes não têm medo da concorrência com as grandes

Para o professor de Marketing Antonio Carlos Morim, o mundo da microcervejaria não compete com as grandes. “Quando se conversa com esses produtores, percebe-se que eles não enxergam concorrência nem mesmo com as empresas do mesmo segmento. Eles acreditam no diferencial do seu produto”, afirma.

A Colorado segue com a fabricação em Ribeirão Preto%2C e seus funcionários continuam compondo o quadroDivulgação

Além disso, segundo ele, o Brasil ainda consome mais cerveja do que produz, ou seja, ainda há muito espaço a ser explorado por esses fabricantes.

Gilson Val, sócio-fundador na Jeffrey, confirma a tese do professor. “A gente não fica olhando para o lado. Temos nossos próprios projetos. Acabamos de desenvolver um sorvete com o Mil Frutas, sabor de Jeffrey Niña. Estamos desenvolvendo uma linha de cervejas com a Roberta Sudbrack e o Thomas Troigrois. Queremos voar com a nossa direção, no nosso caminho. Quero mais é que a indústria se desenvolva mesmo, para mim é muito bom o surgimento de novas cervejarias”, afirma.

Segundo Gabriel Di Martino, cervejeiro da Vila St. Gallen, o setor cervejeiro está bem comportado em relação à crise, o que favorece o surgimento de novas empresas.

“Todos estão crescendo. A nossa média de alta nas vendas é bem satisfatória, em torno de 35% a cada ano. A gente tem volume de produção considerável, mas visa qualidade, não quantidade. Escolha de matéria prima é muito importante”, conta o especialista.

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