Por thiago.antunes

Rio - A paralisação das escolas municipais do Rio completa hoje 32 dias e deixa, segundo a Secretaria de Educação (SME), 300 mil alunos sem aula (de um total de 683.449 matriculados), o que representa 43,89% da rede. Há avanços, reconhecem os sindicalistas e a Prefeitura do Rio, mas há temas, em alguns casos pontuais, que vão além da questão salarial e fazem parte do dia a dia de agentes auxiliares de creche, merendeiras, inspetores, professores e demais profissionais.

Cenários desconhecidos de parte da sociedade, como falta de material de limpeza ou higiene, infiltrações, portas caindo e que a Secretaria Municipal de Educação ainda não apresentou solução nas mesas de negociação.

A greve é marcada por impasses como esse em torno dos 21 pontos apresentados pelo Sepe (Sindicato dos Profissionais de Educação), sendo 11 já aceitos pelo governo, como reajuste salarial de 8%, e em projetos, que os grevistas se queixam de não terem prazo para sair do papel.

Docentes cobram fixação de prazos para as propostas apresentadas pela Prefeitura do Rio%2C entre elas a de reajuste salarial Estefan Radovicz / Agência O Dia

Após um mês de greve, três reuniões com o Executivo e três acordos de fim de greve assinados, as assembleias do Sepe já não levam 25 mil pessoas às ruas. Mas o total de alunos sem aula, fornecido pela própria SME, comprova que apesar de não estar presente nas assembleias, o grupo que cruza os braços está mobilizado e continua fora das salas de aula do município.

Apesar de já ter recebido orientação do sindicato para voltar ao trabalho nas escolas de cabeça erguida, há o grupo majoritário nas assembleias que defende o retorno só após ver alguma reivindicação aceita sair do papel.

Em nota oficial, a SME destaca seu lado do impasse e diz que não mediu esforços para atender o que pediam os professores. E que, apesar da posição dos grevistas em manter o movimento, “prejudicando diariamente quase 300 mil alunos”, a “Prefeitura do Rio sempre manteve a decisão de cumprir todos os pontos dos acordos realizados”.

Na cozinha do Ciep Samuel Wainer%2C na Tijuca%2C as tampas das panelas são antigas ou não existem. Os alimentos ficam expostosDivulgação

Crecheira do Espaço de Desenvolvimento Infantil (EDI) Professora Raquel Kelly Lanera, em Santa Cruz, Maristela Santos, 34 anos, foi um dos braços levantados na assembleia da última sexta-feira e integra o grupo de servidores da Educação municipal que votou pela continuidade da greve: “Cuido de 25 crianças. Não há banheiro em todas as salas e temos que improvisar. O piso é escorregadio e temos que tomar cuidado para que não ocorram quedas e os estudantes se machuquem”.

A queixa pontual é exemplo dos relatos recebidos pelo DIA entre as duas últimas assembleias da semana passada. A exposição das rotinas evidencia o que os grevistas apontam como motivo para manter a paralisação que já dura 32 dias.

A professora Gissele Luanda, 33, professora do EDI Fundação Leão XIII, no Morro de São Carlos, no Estácio, conta que não há janelas na unidade, só basculantes. Além disso, existe um portão estreito para entrada e saída. A Secretaria Municipal de Educação esclareceu que “realiza grandes investimentos nas unidades escolares para oferecer a alunos, professores e funcionários ambiente adequado”.

Na Escola Municipal Prefeito Juarez Antunes, em Bangu, um dos problemas da unidade é a ausência de ar-condicionado, mesmo com as instalações prontas, reclamou um professor que preferiu não se identificar. Segundo a secretaria, um dos acordos estabelecidos com o sindicato da categoria prevê a elaboração de um cronograma para a climatização das escolas da prefeitura, pelo qual mais 130 unidades escolares serão contempladas já em 2013.

Professora há 15 anos da rede municipal, Anna Paula Meirelles de Azevedo, 45, relata que há três anos a direção da Escola Municipal Barão de Itacurussá, na Tijuca, busca alguma empresa para fazer obras estruturais para acabar com “inúmeras infiltrações e problemas na parte elétrica”. Contudo, segundo a docente, a secretaria informa à direção que não pode fazer a obra.

“Em uma das salas, quando chove, a água escorre como cachoeira pelas paredes. É preciso colocar uma bacia para aparar a água que desce pelo ventilador de teto”, explica Anna.

Em nota, a Secretaria Municipal de Educação informou que desde 2009, foram construídos 118 Espaços de Desenvolvimento Infantil e 13 escolas. Além disso, 22 acabaram reformadas e outras 17 reconstruídas. A “secretaria ressalta ainda que sempre realiza reparos e reformas, por meio do Conservando Escolas, priorizando as necessidades identificadas”. 

A próxima assembleia da categoria está marcada para terça-feira, às 14h. Ontem, professores iniciaram vigília na residência do prefeito.

Merendeiras de escolas municipais reclamam do acúmulo de funçõesDivulgação

Planos envolvem pauta pedagógica

Em meio a cobranças por atitudes concretas, a Secretaria Municipal de Educação destacou alguns planos para o futuro. Para cumprir a meta de colocar 35% dos alunos da rede em turno único até 2016, com sete horas de aula, segundo a pasta, a prefeitura prevê investir, por meio da Fábrica de Escolas, cerca de R$ 1,5 bilhão na construção de novas unidades e na reforma/ampliação de outras já existentes.

A estimativa para o período de 2015/2016 é de 99 novas construções e 80 unidades reformadas/ampliadas.

A secretaria ressalta, também, que vem aumentando o atendimento na Educação Infantil, com novas construções. Somente para este ano, estão previstas mais 30 novos EDIs.

Em recente entrevista ao DIA, a secretária municipal de Educação, Cláudia Costin, citou as resoluções que tratam da pauta pedagógica. Entre as quais, autonomia em relação ao caderno pedagógico e à garantia de que não haverá reestruturação das unidades sem passar por discussão com cada escola.

10 exemplos de queixas

1 - Falta de pessoal - A merendeira Flávia Oliveira Paes, 41, diz que na Escola Municipal David Perez, em Cordovil, trabalha com três servidoras para atender a 600 alunos. Na Escola Municipal José do Patrocínio, em Irajá, o professor Thiago Bruno Vital, 32, explica que há três inspetores para 800 alunos. A agente auxiliar de creche Maristela Santos, 34, relata que cuida sozinha de 25 crianças de 3 e 4 anos de idade no EDI (creche)Professora Raquel Kelly Lanera, em Santa Cruz.

2 - Ar condicionado - Professor que preferiu não se identificar informa que a Escola Municipal Prefeito Juarez Antunes, em Bangu, foi reformada para receber os aparelhos, mas não há previsão para instalação. Já na Escola Municipal José do Patrocínio, em Irajá, na turma do professor Thiago Bruno há um ventilador para 35 alunos. Segundo ele, o calor gera agitação na turma, o que atrapalha as aulas.

3 - Falta de material - Professora do EDI Professora Raquel Kelly Lanera, em Santa Cruz, Maristela Santos afirma que não há material de higiene para as crianças. A merendeira Ana Maria de Castro Barros, 54, por sua vez, se queixa da falta de material de limpeza. “Muitas vezes tenho que levar de casa”, diz.

4 - Infiltração - Na Escola Municipal Barão de Itacurussá, na Tijuca, a professora Anna Paula Meirelles, 45, conta que há muitas infiltrações. “Em uma das salas, quando chove, a água escorre como cachoeira pelas paredes. Professores improvisam bacia para que as crianças não escorreguem”, afirma.

5 - Higiene -  Segundo a merendeira Cristiane Souza Rodrigues, 41, no<MC1> Ciep Samuel Wainer, na Tijuca, há um ralo aberto na cozinha, de onde saem ratos e baratas. “Temos que chamar a Comlurb toda a semana”, conta.

6 - Várias funções — No Ciep Samuel Wainer, na Tijuca, a merendeira <MC1>Cristiane Souza Rodrigues, 41, se queixa do acúmulo de funções. “Temos que cozinhar, servir e limpar todo o refeitório”, diz. Merendeira na Escola Municipal David Perez, em Cordovil, Flávia Oliveira Paes, 41, afirma: “Somos cozinheiras. Nosso salário está muito aquém do trabalho. Temos até que moer carne para muita gente”, revela.

7 - Estrutura - A professora Valéria Giorno, 52, comenta que a porta da sala onde dá aula, no EDI Rocha Pombo, em Piedade, está caindo. “As crianças precisam levantar a porta para conseguir abrir, o que é perigoso”, avalia. Além disso, na Escola Municipal Santos Dumont, em Marechal Hermes, as janelas estão em péssimo estado, segundo a professora Karina Nizo, 35 anos.

8 - Equipamento - Segundo professor que não quis se identificar, na Escola Municipal Cora Coralina, em Campo Grande, as mesas foram feitas para crianças e não suportam o peso dos adolescentes, por isso quebram, e demoram a ser substituídas. Na Escola Municipal Paula Fonseca, em Colégio, a professora Viviane Meneguitte, 34, conta que chegou um aparelho de multimídia, mas não conseguiu usá-lo por falta de estrutura. “O teto não aguenta o peso do aparelho”, explica.

9 - Refeitório - Professora na EDI Fundação Leão XIII, no Morro de São Carlos, no Estácio, Gissele Luanda, 33, conta que lá não há refeitório. As crianças almoçam em um corredor com bancadas na parede. Como os bancos não têm apoio nas costas, os alunos mais novos não conseguem se equilibrar e acabam caindo.

10 - Reprovação - Professora da Escola Municipal Santos Dumont, em Marechal Hermes, Karina Nizo explica que com a meritocracia, o docente que reprova determinado número de alunos deixa de ganhar o 14º salário, por isso, o professor é obrigado a aprovar os estudantes. “Na minha turma de terceiro ano do Fundamental há 14 alunos analfabetos, que tive que reprovar, mas sou vista como vilã por isso”, diz.

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