Rio - O principal centro de desenvolvimento de metodologias escolares do estado e referência nacional de ensino público de qualidade agoniza, ironicamente, pela ausência de professores nas salas de aula. Inconformados com a recorrente falta de educadores no Colégio de Aplicação (CAp) da Uerj, pais de alunos e docentes levaram a questão à Justiça.
“O colégio funciona em turno integral, mas, em alguns dias, meu filho chega a passar oito horas no pátio, sem aprendizado, à espera de professores que nunca chegam”, reclamava Valéria Calmon, uma das várias mães presentes à audiência pública realizada ontem na Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) para cobrar, junto à Comissão de Educação da casa legislativa, a contratação de profissionais.
De acordo com a direção da unidade, na raiz do problema estaria o baixo número de editais para concursos públicos lançados pela Uerj. Na ponta, a burocracia enfrentada para contratações de temporários e os R$ 17,77 oferecidos pela hora-aula. Em meio à polêmica, mais de mil alunos que temem pela iminente queda na qualidade de ensino da instituição, conhecida pelo alto número de aprovações no Enem.
“Hoje, cerca de 50% do corpo docente do CAp são compostos por temporários. Torna-se difícil implantar um acompanhamento pedagógico com profissionais que, a qualquer momento, podem desistir do contrato. Quando eles deixam os postos, começamos outra luta: encontrar professores com titulação similar, que aceitem um valor de hora-aula próximo ao piso do Sindicato dos Professores (R$ 15,09). Em escolas particulares, a remuneração chega a ser três vezes maior”, desabafou o diretor do CAp, Lincoln Tavares.
Para o deputado Comte Bittencourt, presidente da Comissão de Educação da Alerj, a solução passa por uma agenda de concursos públicos, que deve ser divulgada pela Secretaria Estadual de Ciência e Tecnologia (à qual a Uerj está vinculada). “O CAp-Uerj não pode ser visto como mais uma escola da rede estadual. Trata-se de uma ilha de excelência”, disse. De acordo com o diretor, para equalização do problema, seriam necessárias 69 contratações em regime de 40 horas semanais e 15 profissionais cumprindo jornadas de 20 horas.
Quadro de evasão piora com cessão de docentes
Enquanto a questão é debatida, pais de alunos, como Paulo D’Ávila, se veêm desesperados. O pequeno Ignácio D’Ávila, aluno do segundo ano do Ensino Fundamental, filho dele, chega a pedir para não ir para a escola, desestimulado pela falta de professores. “Ele não quer ir às aulas de música e artes, por saber que ficará no pátio. Fico com o coração apertado”, desabafou.
Procurada pela reportagem, a Uerj não respondeu aos questionamentos quanto à realização de concursos. Uma decisão judicial de 2009, tomada após processo movido por pais de alunos inconformados com a evasão de profissionais temporários, dificulta o processo de renovação de contratos que hoje chega ao prazo máximo de cinco anos. “Após dois anos, precisamos recorrer à Justiça para renovar. Também esbarramos no alto número de professores cedidos, há muitos anos, para outras instituições”, completou o diretor.