Buenos Aires - Deputados argentinos de diferentes blocos políticos apresentaram nesta quarta-feira no Congresso um projeto de lei para a descriminalização do aborto, uma iniciativa que tenta acabar com os elevados índices de mortalidade materna no país e que foi levada pela primeira vez ao Parlamento em 2005.
O projeto, que foi apresentando em cinco ocasiões para ser debatido sem registrar avanços, foi elaborado por 300 organizações reunidas na Campanha Nacional pelo Direito ao Aborto Legal, Seguro e Gratuito, e aprovado por mais de 60 assinaturas de legisladores de todo o arco parlamentar. "É uma disciplina que o Estado tem pendente, um tema central e estratégico de saúde pública", declarou à imprensa Adela Segarra, deputada do governista Frente para a Vitória (Fpv).
"O tema do aborto está na agenda. Achamos que pode ser aprovado nos próximos dois anos", assegurou Cristina Zurutuza, integrante da associação que impulsiona o projeto. Por sua vez, o chefe de gabinete do governo argentino, Jorge Capitanich, disse nesta quarta-feira que o aborto não está na agenda do Executivo, que, assegurou, "nem promove nem impulsiona" sua descriminalização, e afirmou que é uma questão "que não lhe incumbe".
O projeto apresentado quer permitir o aborto durante as primeiras 12 semanas de gestação e o acesso à prática gratuita da intervenção médica no sistema de saúde público e privado, sem autorização judicial prévia. Estabelece, além disso, que se poderia interromper o processo de gestação se a gravidez fosse resultado de um estupro, se estivesse em risco a saúde da mãe, ou se existissem más formações fetais graves.
A iniciativa promove, além disso, uma forte intervenção do Estado, que vai além de sua proposta legislativa e que se resume no lema "educação sexual para decidir, anticoncepcionais para não abortar, aborto legal para não morrer". "É uma das questões pendentes destes 30 anos de democracia. Um direito humano fundamental", afirmou o deputado da opositora União Cívica Radical (UCR), Manuel Garrido.
Embora o aborto esteja proibido por lei na Argentina, salvo em casos de perigo para a vida ou a saúde da mãe, estupro ou abuso a uma mulher incapacitada, foram registradas cerca de 500 mil interrupções voluntárias da gravidez por ano, segundo números oficiais.
A presidente argentina, Cristina Kirchner, não se pronunciou nunca publicamente sobre este assunto, mas há quatro anos freou uma resolução que permitia aos médicos interromper gravidezes resultado de estupros sem necessidade de intervenção judicial. As leis argentinas aceitam o aborto nos casos de estupro provado, perigo para a vida ou incapacidade mental, mas estes casos devem ser discutidos nos tribunais.