Por felipe.martins

Rio- Já pensou em ter que levar uma lupa toda vez que for fazer compras? Já teve medo de comprar algo que pudesse fazer mal a quem fosse comer? Essas são duas perguntas que as criadoras do movimento ‘Põe no Rótulo’ responderiam com um enfático ‘sim!’. A campanha, iniciada em redes sociais por mães de crianças com alergia e intolerância alimentares, luta para que indústrias descrevam com clareza os componentes alergênicos nas embalagens.

Uma das coordenadoras é a jornalista Mariana Claudino, 40 anos, cujo filho, Mateus, 4, tem alergia à proteína do leite. “Já comprei biscoito porque o rótulo dizia não ter leite, nem soro de leite. Ele ficou inchado e passou mal.” Em outra vez, Mateus foi para um hospital com risco de morte após entrar no estágio pré-choque anafilático.

Beatriz%2C 2 anos%2C é intolerante ao glúten. Na creche%2C ela conta com alimentação diferente da dos coleguinhasJoão Laet / Agência O Dia

Segundo o presidente da Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia, Fabio Morato Castro, alérgicos estão sujeitos à anafilaxia: reação grave e abrupta a substância ingerida ou presente no ambiente. Há perigo de edema de glote (‘fechamento da garganta’) e redução da pressão arterial a zero — situações que podem matar. A anafilaxia também pode provocar inchaço nos lábios e pálpebras, coceiras e sintomas de asma. Para acabar com a crise, médico aplica injeção de adrenalina, que regulariza a pressão e ajuda o paciente a respirar.

“Se a empresa não define com clareza os componentes fica impossível saber se o alérgico vai reagir. Não queremos guerra com indústrias; só que deem a informação adequada para alimentarmos nossa família”, argumenta Mariana.

Palavras ilegíveis

Há ainda nomes de substâncias escritos em outras línguas ou por designações científicas. Além disso, as letras são muito pequenas. “Sempre preciso de lupa”, diz a contadora Daniele Guimarães, 38, mãe de Beatriz, 2 anos e 7 meses, intolerante a glúten. Estudos da USP mostram que 39,5% das reações alérgicas estão ligados a erros na leitura de rótulos. “Reunimo-nos com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, órgãos de defesa do consumidor e indústrias, e formamos comissão para definir normas de rotulagem”, diz a advogada e coordenadora da campanha, Cecília Cury.

Escolas têm de se adaptar a alunos com reações alérgicas

O Centro Educacional Acalanto, em Botafogo, adaptou sua rotina com a chegada de uma aluna intolerante ao glúten, a pequena Beatriz, de 2 anos e 7 meses, filha da contadora Daniele Guimarães. “O gastroenterologista da Beatriz enviou para a gente um livro de recomendações e cuidados chamado ‘Criança celíaca indo para a escola’. Com as orientações, preparamos comidas que a Beatriz também pudesse comer. Alguns pratos são só dela, também”, explica a diretora da creche, Anna Emília Ribeiro.

Thiago (abaixo%2C com a mãe%2C Virgína)%2C 8 anos%2C alérgico a leite%2C já foi levado para hospital%2C com risco de morrer%2C por causa de uma receiJoão Laet / Agência O Dia

A escola é uma aliada indispensável para a inclusão alimentar das crianças com restrições, mas também pode ser um perigo. Alguns anos atrás, a tradutora uruguaia Virgínia Videira Casco, 40, enfrentou o desespero de internar o filho Thiago, hoje com 8 anos, correndo risco de morrer. Ele entrou em choque anafilático depois que, na creche que frequentava, houve confusão com a receita de sua vitamina de banana, que acabou levando leite, como a dos demais alunos. “Thiago tem alergia às carnes de vaca, cordeiro, ovelha e porco, e também à proteína do leite”, conta a mãe.
Intolerâncias alimentares são causadas por enzimas deficientes que atuam na digestão, segundo o médico

Fabio Morato Castro. Já as alergias geralmente são genéticas. “Se um familiar próximo tem alergia alimentar, é possível que esse gene seja transmitido para descendentes”, diz.

O diagnóstico é por exame de sangue e testes alérgicos. O primeiro passo é cortar o alimento causador das reações. É possível também recorrer à imunoterapia, feita por poucas clínicas no Brasil, e que envolve um alto risco para saúde, de acordo com Fabio. “Administramos dosagens pequenas do alérgeno, diluído em outras substâncias, em ambiente controlado. É uma técnica arriscada, mas que faz o paciente se tornar tolerantes ao final”, explica.

Na intolerância, pode-se procurar cápsulas contendo as enzimas necessárias à digestão.


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