Por clarissa.sardenberg
Argentina - Um polêmico editorial do jornal "La Nación", que sugeria o fim dos julgamentos dos integrantes da ditadura militar argentina, publicado nesta segunda-feira, dia seguinte à vitória do conservador Mauricio Macri, provocou rejeição na Argentina. Jornalistas da própria publicação condenaram o texto intitulado "Chega de vingança", que também pedia o fim da "perseguição" contra magistrados acusados por organismos de direitos humanos por sua atuação durante a ditadura.

A reação da redação do "Nación" começou com alguns dos principais nomes da redação. "Militei nos 80 para que fossem presos os que violaram os direitos humanos, assim, não gostei do editorial do LN", disse Martín Kanenguiser, um dos principais jornalistas do veículo, no Twitter. "A redação do @LANACION em plenário contra o editorial do jornal. Dia histórico para a imprensa na Argentina!", assinalou Diego Batlle, que também trabalha no jornal.

Jornalistas do 'La Nación' em reunião na redação para repudiar editorial do jornal Reprodução Internet

Em seguida, os jornalistas da publicação convocaram uma assembleia urgente para repudiar o editorial. "Nós, os trabalhadores do jornal ' La Nación' dizemos sim à democracia, à continuidade dos julgamentos por crimes contra a humanidade e dizemos não ao esquecimento. Por memória, verdade e justiça", assinalou o comunicado aprovado na assembleia e publicado nesta terça-feira pelo jornal, junto com uma fotografia da reunião em que se viam cartazes de "Nunca mais" e "Eu repúdio o editorial".

Reações na mídia e governo 
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"Não esperaram nem um dia", escreveu o jornal "Página 12" na manchete, que criticou também em seu interior o que tachou de um artigo de opinião "do tempo das cavernas". Segundo o jornal governista, o triunfo conservador nas eleições presidenciais de domingo levantou "as esperanças dos jurássicos".
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"Não há vingança, há memória, verdade e justiça", expressou nesta terça o governo argentino através do chefe de Gabinete, Aníbal Fernández. "Me parece um susto o editorial, mas as respostas a ele, desde sua própria redação me pareceram saudáveis e mostram uma Argentina que não quer voltar atrás", acrescentou.
Políticos, como o ex-chefe de Gabinete, Jorge Capitanich; a deputada Victoria Donda; advogados, jornalistas e ativistas de Direitos Humanos se somaram à condenação. "Uma vergonha o editorial do jornal ' La Nación'. Felicito seus redatores por denunciá- la. #MemoriaVerdadeeJustiça", escreveu o Prêmio Nobel da Paz de 1980, o argentino Adolfo Pérez-Esquivel, em seu perfil no Twitter.
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"Quem comete um crime tem que pagá-lo, e tem que pagá-lo com o que diz a lei. Se são prisões permanentes não importa a idade", disse a presidente das Avós da Praça de Maio, Estela de Carlotto, na televisão. "São pessoas muito perigosas, que o ' La Nación' não põe, são idosos que não se arrependeram, não confessaram; além disso, prometeram voltar a fazê-lo se for necessário", acrescentou.
Jornal publica resposta
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O " La Nación" teve que pedir desculpas nesta terça-feira à senadora Norma Morandini, que após ser mencionada no texto denunciou que a postura do jornal era uma piada. Sem entrar na polêmica sobre o infeliz editorial, Mauricio Macri, afirmou ontem que, ao tomar posse, em 10 de dezembro, dará continuidade aos processos judiciais por crimes contra a humanidade dos envolvidos na ditadura militar, uma das bandeiras políticas kirchneristas desde a chegada de Néstor Kirchner ao poder, em 2003.