Por felipe.martins

Rio - A solução para desafogar o trânsito no Grande Rio pode estar na Baía de Guanabara. Estudo realizado há dois anos mostrou que os congestionamentos na Região Metropolitana chegam a 130 quilômetros por dia, o que equivale a pouco mais de duas Avenidas Brasil, a maior via expressa da cidade, ou dez pontes Rio-Niterói completamente paradas — e muita paciência envolvida. A Firjan (federação das indústrias do estado), que fez o cálculo na ocasião, deu a receita que seria capaz de reduzir a quase um terço os engarrafamentos. Nota técnica divulgada ontem pela entidade aponta que existe demanda suficiente, e, portanto, viabilidade comercial, para a criação de 14 novas linhas hidroviárias na Baía de Guanabara e nas lagoas da Barra da Tijuca.

Se todos os projetos fossem implementados, essas rotas teriam potencial para absorver 272,4 mil viagens por dia e tirar 100,9 mil veículos das ruas. A extensão diária dos congestionamentos diminuiria 84,1 km. “Comprovamos que existe demanda. O que resta para essas propostas saírem do papel é estratégia de governo para optar por torná-las realidade”, diz Riley Rodrigues, especialista em competitividade industrial e investimentos do Sistema Firjan.

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Só no eixo da Baía de Guanabara, que hoje conta com apenas quatro rotas de barcas, são propostas 11 novas ligações. Dessas, cinco conectam a cidade do Rio ao Leste Fluminense: Praça 15-Gradim (São Gonçalo), Botafogo-Praça Arariboia (Niterói), Botafogo-Charitas (Niterói), Praça 15-Itaipu (Niterói) e Cocotá (Ilha do Governador)-Gradim. Partindo da Praça 15, haveria ainda a possibilidade de oferecer transporte aquaviário até Duque de Caxias, ao Aeroporto do Galeão, à Ilha do Fundão e à Ribeira (ligação desativada há pouco tempo). Outros dois serviços propostos seriam entre o Aterro do Flamengo, na altura do Museu de Arte Moderna, e o Galeão, além do deslocamento dentro de Niterói entre a Praça Arariboia e Itaipu. Em conjunto, estas novas linhas poderiam prover mais de 156 mil viagens por dia, 57,8 mil veículos a menos no trânsito.

A universitária Carolina Zacharski, de 23 anos, que se desloca frequentemente entre Botafogo e Charitas, onde estuda, gasta até 1h10 no percurso, indo de ônibus. De acordo com Riley Rodrigues, o tempo cairia para entre 15 e 20 minutos apenas, dependendo se o tipo de embarcação escolhido fosse um catamarã, como os que são operados pela CCR Barcas nas linhas atuais, ou aerobarco. “Seria perfeito! Muitos estudantes das faculdades do Rio moram em Niterói e São Gonçalo e seriam beneficiados”, comenta a futura enfermeira.

A também estudante Camila Lopes, 23, leva 45 minutos da Central do Brasil até Caxias entre o trabalho e a faculdade. O trajeto pelo mar seria traçado de 25 a 40 minutos, conforme o estudo da Firjan, o que também dependeria do modelo de barco. “Os trens não estão mais tão ruins como antigamente, consigo até vir sentada. Mas, se eu puder chegar em 20 minutos, com certeza vou de barca”, planeja.

A federação também sugere ligação entre a Barra da Tijuca e o Centro com o uso de embarcações próprias para navegação em mar aberto, o que seria capaz de liberar, ao longo do dia, 32,8 km de vias rodoviárias. Estima-se que o serviço hidroviário tenha potencial para realizar até 106,4 mil viagens diárias, o equivalente a 15,6% das 679, 3 mil viagens/dia feitas hoje nesse trajeto por meios convencionais.A nota técnica também defende a criação de linhas internas na Barra, utilizando as lagoas de Marapendi e de Jacarepaguá.

“As ligações hidroviárias no complexo lagunar da Barra possibilitariam aos usuários saltarem próximo à futura estação da Linha 4 do metrô, no Jardim Oceânico, que fará a conexão da Barra da Tijuca com a Zona Sul e o Centro. A partir da combinação das hidrovias com a Linha 4 do metrô, seria possível retirar milhares de veículos ao longo do trajeto Barra da Tijuca-Centro, reduzindo ainda mais os congestionamentos”, sustenta o estudo.

A Secretaria Estadual de Transportes vai apresentar, neste semestre, o resultado do Plano Diretor de Transportes Urbanos (PDTU) e do Plano Estratégico de Logística de Cargas (PELC), que projetam o desenvolvimento da mobilidade e direcionam os investimentos em infraestrutura no estado. O órgão também fará avaliação técnica se é possível viabilizar as linhas.

Parte das linhas apontadas já havia sido cogitada, mas, segundo Riley, a teoria de que não havia demanda sempre derrubou os projetos. Em alguns casos, são necessários investimentos maiores, como a complexidade de dragagem na região de São Gonçalo e Duque de Caxias e a necessidade de abertura de um canal na Ilha do Fundão. “Esse momento de crise financeira é o ideal para se pensar em soluções que potencializam a economia. Os engarrafamentos na Região Metropolitana geraram um custo de R$ 29 bilhões em 2013 (os números levam em conta a remuneração média do trabalhador local por minuto que ele perde no trânsito). O governo deve estabelecer parcerias com a iniciativa privada.”

Engenheiro de Transportes da Uerj, Alexandre Rojas critica o estudo. “Essas linhas não têm demanda e mais operações na Baía só seriam possíveis se ela fosse despoluída e se houvesse controle do tráfego de navios. Isso é um pesadelo.” Já Eva Vider, engenheira de Transportes da UFRJ, é a favor. “A maioria dessas rotas foi proposta no Plano Diretor de 2003. Um modal não compete com os outros, eles devem se somar.”

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