Por bferreira
Rio - Ao longo de anos trabalhando na produção de saúde mental, inúmeras vezes me deparei com situações muito semelhantes. Um familiar que, em determinado momento, surta, enlouquece, é apontado por todos como o problema. Mas, quando examino a situação detalhadamente, constato que ele acaba representando a doença da família, uma herança genética doente.
E o alívio de todos é imediato, já que caiu para o sujeito o problema. Os outros estão livres do risco temido, velado. A figura do bode expiatório está instalada, e o paciente é usado como depositário de todo tipo de críticas e insatisfações. Enquanto a doença nele se revela, outros se protegem, se escondem. Ele dá voz à loucura de todos. Internar é a solução proposta imediatamente, em contrariedade à reforma psiquiátrica que propõe a não-exclusão do sujeito e, sim, sua integração ao convívio social.
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Outro dispositivo de controle é a interdição. Pacientes sob essa ameaça, na maioria dos casos, estão envolvidos com alguma forma de lucro a favor de um membro da família que encontra no transtorno mental do parente a oportunidade de lucrar, assumindo a tutela deste. Mas quer a tutela do dinheiro e não a doença.
Tenho visto familiares bastante comprometidos mentalmente, obstinados em afirmar a incapacidade do outro com paixão doentia, fixados, digo mesmo obstinados, na oportunidade da interdição como solução de suas dificuldades financeiras. O dinheiro está sempre em jogo nesses casos. Difícil encontrar alguém desfavorecido economicamente, que tem transtorno mental, ser alvo de uma interdição.
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Em conformidade com a reforma psiquiátrica, entendemos que as cidades precisam conviver com a loucura, com o sujeito diferente. Claro que preservada dos riscos que alguns oferecem a si e a todos. Bom-senso na avaliação, com distância do desejo de punir através de internação e confinamento, produz a garantia dos direitos constitucionais visando à integração de quem sofre de transtornos mentais, a sociedade.
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Psicanalista