Rio - Após a polêmica sobre a importação de médicos estrangeiros no Brasil, outra discussão acalorada vem à tona: a suposta receita médica contendo erros de dosagem, prescrita por um profissional argentino entre várias outras que correm na internet. Creditar o vazamento desta informação à insatisfação dos médicos brasileiros seria simplista e ingênua. Os médicos, quando não aceitaram as condições para suprir carências de profissionais alardeada pelo governo, não estavam evitando morar no Maranhão ou em Rondônia por um capricho, mas sim se preservando de atender pacientes sem leito, material adequado, infraestrutura ou higiene, no Sudeste ou nos rincões do Norte do país.
O programa ‘Mais Médicos’ perpassa todas as especialidades, dentre elas a psiquiatria. O tema em questão será debatido esta semana em Curitiba, durante o 31º congresso da especialidade, que reunirá mais de seis mil pessoas. Quase 30% da população brasileira padecem de algum tipo de transtorno psiquiátrico, como depressão, bipolaridade, ansiedade e autismo.
Mais urgente do que dispor de mais médicos, estas mais de 40 milhões de pessoas precisam de acesso a exames e a medicamentos e tratamentos preventivos, atendimento ambulatorial, internação quando prescrita por médico capacitado, qualificação do atendimento nos CAPs (Centros de Atenção Psicossocial), sucateados na última década, e tantas outras carências com as quais os médicos lidam diariamente.
A atual discussão sobre o exercício da medicina no Brasil por estrangeiros tira o foco do ponto primordial – as condições de trabalho dos médicos – e tenta desvirtuar-nos de uma realidade: estamos entre os melhores médicos do mundo e este patrimônio, construído em parceria com os brasileiros, não deve ser questionado por nenhum governante.
Psiquiatra e presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria