Por bferreira

Rio - Na décima tentativa de escrever a coluna, as pernas entrelaçadas na posição de Lotus enquanto os dedos, em gestos obscenos, fecham um círculo de OK, lembrei do otimista. Diz o Ameaçador:

— Olha aí. Tua Batata tá assando!

— Hum...Quentinha! Que delícia!

Está na sua índole, a inocência. A cidade, ponta-cabeça, o Porto à beira de um parto, cones se manifestando por jornada de obstruções urbanas, o otimista, em transe e ainda na primeira marcha, espera na ponte, avistar o pedágio que o dá direito a desfrutar da Região dos Lagos ou Jardins Oceânicos. A geografia dessa felicidade tem paralelo com os nossos salários. O sujeito, que no guichê do banco separa o da passagem e mais algum pra encher a barriga, larga na carteira um saldo que cobre dois varejos e um pingado no primeiro dia útil. Em muitos casos, nem o otimista!

Eu estava em viagem, já escrevi sobre, quando percebi uma pequena aglomeração. Era uma reivindicação internacional : “Stop killing dog in Romênia!” (Parem de matar cachorros na Romênia). Informado, soube que nesse país da Europa Oriental, o governo autorizou a matança de vira-latas soltos pelas cidades. Minha ironia poliglota argumentou:

— E no Brasil, que estão matando cachorro a grito?

Tenho a alma otimista. Sou compositor. Acredito que o carro correndo no acostamento é defeito no hidramático, que a empada foi assada há pouco, assim como é confortável e prazeroso passar o Dia Das Mães em churrascaria.

Médico e especialistas alertam pra exagerada felicidade, uma catarse de alegria, histeria frouxa na piada sem graça, de papagaio, elefantes ou do Joãozinho, aonde nem a tragédia esconde a boca aberta cheia de dentes esperando a sobremesa chegar. Mesmo assim, prefiro o otimista.
O antagonista me perturba.

Outro dia, entre gemidos monossilábicos, encontro um conhecido da vida. Macambúzio, confidencia:

— Tu sabe que eu só tenho um dente da boca, sabe? Meu, mesmo, só um...

— E daí?

— Pois é. “Tá” doendo sem parar! Acho que é canal!

Apesar do ar-condicionado do Santos Dumont parado nesses dias de quarenta graus e repetidas situações de “imagina na Copa?”, estou otimista com o Rio de Janeiro.

E-mail: moacyrluz@ig.com.br

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