Por bferreira
Rio - Onde é que eu estava com a cabeça quando inventei de mudar de casa? Estava quieta lá, precisando de espaço, reclamando da vida, mas eu me entendia de alguma forma. Agora, estou num espaço maior, é verdade, mergulhada num oceano de caixas, totalmente perdida e sem saber por onde começar para tornar minha vida uma coisa possível de ser vivida. Tudo me incomoda, inclusive a bagunça geral. Mas me incomodam, e muito, os cheiros diferentes, o silêncio que dá prazer e assusta ao mesmo tempo, os ruídos que não reconheço, os barulhos que ainda não identifico. Me mudei pra muito perto e tenho a impressão que me mudei pra muito longe, a emoção e o carinho pelo endereço antigo ainda me tocam o coração e o novo não me ajuda em nada na recomposição afetiva.
Quase que me arrependo. A rotina, que incomoda tanta gente me fascina e me acalma. Ao chegar me descubro sem televisão, sem internet, sem notícias e noticiários, sem a novela e o malvado Félix e sem ação diante da necessidade da presença e do serviço das dezenas de profissionais(?) ou de amadores que preciso para tudo voltar ao lugar. Decidi chamá-los de “ronaldos”, os trapalhões. A mudança em si foi um caos. A empresa contratada deveria ser proibida, em nome da defesa do consumidor, de operar no mercado. Destruíram dois dos três móveis que transportaram, quebraram quadros, misturaram em caixas sem identificação coisas do escritório, da cozinha, da sala, embalando “ronaldamente”, digamos assim. As coisas da geladeira, por exemplo, ficaram numa caixa sem identificação e só foram encontradas 24 horas depois, em meio a caixas de livros e, claro, tiveram o lixo como destino. E o mais grave: os “ronaldos” não conseguiram fazer a mudança num dia só e só consegui dormir na minha própria cama porque até os mais irresponsáveis tremem diante do Procon.
Publicidade
Mas há “ronaldos” em várias áreas, como na companhia telefônica, cujo técnico instalou o telefone, discutindo com a namorada, pelo rádio dele, enquanto trabalhava. A TV a cabo mereceu três visitas técnicas. Nas duas primeiras, os técnicos só colocaram dificuldades . Na terceira visita, três valorosos rapazes operaram o milagre da TV a cabo e da internet e a notícia voltou a esta casa. O grande Leo já resolveu tudo do computador, a cortina ficou dez, Evandro Junior me mandou um quadro lindo, a bananeira de Rita Lessa ficou um show, a chuva parou, o sol voltou, o Flamengo ganhou mas o caos continua. E eu continuo me perguntando: Onde é que eu estava com a cabeça quando tomei esta decisão?
Leda Nagle é jornalista, escritora e apresenta na TV o ‘Sem Censura’
Publicidade