Por bferreira
Rio - No sábado eu tinha ido à inauguração da Arvore de Natal da Lagoa e no palco cantaram o Planeta Água, com o coral Bradesco dando show. Foi emocionante: “Água que nasce na fonte... matando a sede da população... Água... Planeta Água”. Aí, no dia seguinte, o ‘Fantástico’ mostrou o envenenamento ao qual é submetido o povo pobre do sertão de Alagoas, Piauí, Pernambuco e Bahia, através dos vampiros das águas, uma quadrilha que envolve políticos, oficiais do exército e empresários inescrupulosos, que ganham milhões para transportar a água que deveria ser potável para os que dela necessitam de forma vital. Que país é este, que faz sua gente beber água contaminada com combustível, fezes humanas e de animais, barro? Que governos são estes, que permitem tamanha indignidade?
Pois diante de nós estão as donas de casa de rostos engelhados pelo sol do sertão, dizendo que ali não chegava água há meses e, quando chega, é imprópria para beber. A indústria da seca, cruel manobra dos poderosos para nunca deixar o Brasil resolver o problema da água no sertão. Tudo o que se faz fracassa, como esta obra da Dilma de transposição das águas que, sem conseguir mover uma única gota, já gastou milhões, precisa de aditamentos de mais milhões, e o que foi construído já está se destruindo. Ouvimos falar de cifras estratosféricas, e o ‘Fantástico’ nos mostrando a cara daquele povo miserável, bebendo a água barrenta.
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E a informação de que um pipeiro, muitos parentes dos vampiros, ganham até R$ 15 mil por mês para não cumprir o contratado e dar propinas para corruptos de todos os lados. Foi uma linda reportagem sobre nossa triste realidade. Sofrida em conteúdo, mas pungente em determinação e coragem. Que honra o jornalismo, que coloca-se ao lado dos necessitados e grita por justiça. O repórter batia na porta das casas, parava caminhões-pipas em estradas de barro alaranjado e, conversando, ia ouvindo descalabros dos que deveriam estar resolvendo a situação.
E a única conclusão a que chegamos é que aquele povo está se afogando no mais absoluto abandono porque este abandono, esta não-fiscalização, enriquece muita gente de colarinho branco. Já tínhamos flagrado os que desviaram dinheiro da merenda escolar, agora estamos diante dos que negam água. Onde vamos parar? Na última cena, a imagem comovente de um velho e uma velha carregando na cabeça tonéis de cinco litros de água cada um. Andam quilômetros para beber aquilo. A outra opção é a morte. E neste equilíbrio das bilhas da salvação, nossas lágrimas por elegermos ladrões que contratam ladrões e transformam a cúpula em quadrilha.
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Milton Cunha é carnavalesco e Doutor em Ciência da Literatura pela UFRJ