Por tamyres.matos
Rio - Fome não se combate apenas com prato de comida. Digerida a esmola em forma de alimento, abre-se de novo o oco na barriga, buraco negro da cidadania. Não basta dar de comer ao faminto. Para que o direito à cidadania não fique restrito aos discursos políticos, o combate à fome exige, no mínimo, reforma agrária, distribuição de renda e escolarização compulsória de todas as crianças.
O mesmo se aplica à violência. Não é um fenômeno restrito a São Paulo e outras cidades populosas. Nova York é mais perigosa que a Favela da Rocinha. O grave é quando os narcotraficantes infiltram-se nas malhas da polícia, corrompendo juízes e delegados, obtendo armas privativas das Forças Armadas e delimitando territórios sob o seu comando.
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O traficante, como o político corrupto e o empresário especulador, é filho da impunidade. A violência do narcotráfico é fruto da violência maior de uma elite que manteve este país amordaçado ao longo de 21 anos de ditadura militar, ceifando ideais e utopias. Esses filhos e netos nascidos durante ou logo após os anos de chumbo não tiveram a educação para a cidadania dos grêmios escolares e dos movimentos estudantis, das academias literárias e dos cineclubes.
Perdidos na noite, muitos buscam a luz na maconha e a onipotência na cocaína. Se o tráfico de drogas é tão bem organizado não é por causa dos assalariados que, quando perdem a cabeça, no máximo recorrem à cachaça. É graças ao sofisticado mercado de consumo que paga bem pela droga. E, na falta de dinheiro, apela para o crack.
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Na espiral da violência, o garoto ‘avião’ que conduz a droga, a ‘mula’ que cobre os pontos de venda, o traficante que dirige e não mora em favela — tem casa com piscina e carro do ano — são o resultado da política equivocada do governo em relação aos direitos sociais. Não basta assegurar renda, encher o bolso, é preciso sobretudo encher a cabeça, dar acesso à cultura, de modo a que haja protagonismo empreendedor.
Quem são os ídolos dos jovens de hoje? Quais os valores mais perseguidos, hoje em dia, pela mocidade? Riqueza, beleza, fama e poder. Ora, quanto mais ambição, maior o tombo. E o rombo no coração. O buraco no peito precisa ser compensatoriamente preenchido de alguma forma.
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Acho no mínimo estranho quando, em cerimônias litúrgicas, observo crianças e jovens, acompanhados de pais e avós cristãos, que não sabem sequer rezar ‘Ave-Maria’ e ‘Pai-Nosso’. O que esperar de uma geração desprovida de espiritualidade?