Por tamyres.matos

Rio - Um país que se paralisa diante da televisão para assistir a um beijo gay na novela — depois de semanas de torcida e campanha por direitos iguais, respeito e cidadania — nem sequer pode cogitar pensar em defender ‘justiçamentos’ como os que ganharam o mundo esta semana. Na superficialidade, as causas não se assemelham, mas têm muito em comum. Derivam da mesma raiz: o Estado Democrático de Direito, das liberdades e da justiça.

O beijo gay de ‘Amor à vida’, escancarado, encerrou anos de tabu, timidamente arranhado com personagens femininas ou demonstrações veladas de afeto. Uma nação justa não persegue homossexuais, ao contrário. Garante-lhes vida plena, com direitos de cidadão assegurados pelo Estado. Busca a tolerância, mas não cerceia a opinião de quem não compartilha dessas orientações. Só pune ataques, ofensas e agressões — infelizmente ainda comuns na sociedade.

Como dissociar, então, o Estado que se esforça pela cidadania de todos do que se cala diante de barbáries? Matar ladrões na rua ou acorrentá-los a postes depois de lichamentos é a negação mais aguda da democracia. É patrocinar a selvageria, a irracionalidade, o vácuo de poder.

Há uma enorme diferença entre garantir julgamento próprio a quem delínque e “defender bandidos”, como apregoam simpatizantes de justiceiros. No meio, existe a negligência do Estado, notada em várias frentes, que falha no policiamento ostensivo, na execução penal, na recuperação de presos e no trato de menores infratores. Mas usar de bestialidade como vingança é jogar ainda mais violência numa pretensa e errônea luta contra a violência das ruas.

Há diversas formas de exigir segurança, cidadania, liberdade e justiça. Uma é protestando sem vandalismo — obviamente sem rojões assassinos. Outra é estimulando o debate político e levar a questão para as eleições.

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