Rio - Houve um tempo em que bastava a pessoa saber somar, diminuir, multiplicar, dividir, acertar, minimamente, a concordância entre o sujeito e o predicado, ter um pouco de bom senso e já estava educada. Depois veio um tempo, principalmente pras moças casadoiras, em que um curso de boas maneiras cabia bem na educação. Com o tempo, caiu em desuso. Ficou cafona. E o tal do bom senso se misturou ao senso comum e deu no tempo em que vivemos hoje. O tempo da falta de delicadeza, da falta de limite, da busca imediata e egoísta da satisfação individual. Um tempo onde o bom senso passa longe. Onde o senso comum está cada vez mais misturado ao preconceito, às crenças e, a grosso modo, à falta de educação.
É um tempo em que todo mundo tem opinião formada sobre tudo, como escreveu o poeta, mas sem ter a menor capacidade de avaliação, de senso crítico. Só assim a gente pode ver, por exemplo, pessoas fazerem fotos delas mesmas diante de um caixão ou com a viúva do morto. As chamadas selfies. Como se fosse absolutamente normal ou natural. A dor do outro é problema do outro. A satisfação do meu desejo é primordial. Por isto é que tenho sempre muito medo quando alguém diz que isto ou aquilo depende do bom senso. Pode até ter dependido um dia, mas neste momento, deixar uma decisão ou uma ação ao sabor do bom senso é muito perigoso.
E a confusão entre o bom senso e o senso comum aumenta a cada dia para prejuízo de todos nós. O psicanalista Francisco Daudt da Veiga explica muito bem a diferença entre senso comum e bom senso. Escreve ele: “O senso comum acata, o bom senso estranha e pergunta. O senso comum não explicita, alude, o bom senso quer saber. O senso comum diz que é porque todo mundo faz assim, o bom senso questiona se é ético ou não”.
Acho que chegou a hora ou está passando da hora de se preocupar com a educação num sentido mais amplo, muito além das operações fundamentais e das concordâncias dos textos. É preciso avançar. O senso comum precisa conviver com o bom senso. E isto serve para todas as questões do nosso tempo. Desde o consumo da água até o que fazer com nosso lixo. Desde as questões filosóficas mais profundas até as bobagens mais frequentes, tipo perder tempo discutindo se fulana ou fulano riu no enterro de alguém.
Basta observar como os pais têm criado seus filhos hoje. Ficam tão preocupados em ser amados que se esquecem que o não é parte do sim e da vida. Não colocar o cotovelo à mesa pode ser considerado uma bobagem, tão dispensável quanto não cortar a folha de alface. Mas ver o outro, perceber limites, ensinar valores, formar cidadãos, respeitar diferenças e diferentes, não discriminar, não desperdiçar, não ser arrogante, não matar, não roubar não vão cair de moda nunca. Ser educada ou educado sempre será chique e fundamental.