Por bferreira

Rio - Quando pousamos no Aeroporto José Martí, em Havana, o comandante do velho Boeing da Cubana de Aviación foi aplaudido. Estavam todos felizes. Eu também. Depois de passar um dia no Panamá, cidade sinistra, qualquer lugar parece uma maravilha. Uma ditadura parecida com a nossa, onde a única abertura é a do Canal.

Que droga de repórter eu era, nem anotei o nome do ditador local. E lá estava eu, no saguão do Aeroporto da Havana, às voltas com a minha amnésia alcoólica. Tinha esquecido de trazer o convite e o nome do hotel ,e se não tivesse ninguém me esperando? Antes de ficar em pânico, dei com uma negona bonita me olhando: “Você é Jaguar? É branco, pensei que era preto.” “Não sou preto, mas minha mulher é (estava no segundo casamento).” Silvia Barbados, da Upec ( Unión de los Periodistas Cubanos) foi a minha babá em Cuba. Me apresentou a René de la Nuez, um dos homens mais importantes de Cuba, caricaturista do ‘Granma’, o jornal do partido, frequentemente citado por Fidel.

Pela vontade do nosso ditador, o Figueiredo, eu estaria em cana. Nunca mais tive notícias de Nuez, teria caído em desgraça? Humor é profissão de risco em ditaduras. Fiquei no Havana Libre, ex-Hilton. O pessoal da Rádio Havana foi ao hotel me entrevistar. A que atribuía minha invitación? A um engano. Não sou comunista e, além disso, pensavam que eu era preto. Os cubanos disseram que acompanhavam meu trabalho no ‘Cruzeiro’ (nunca trabalhei na revista, devem ter me confundido com o Ziraldo). Sempre acompanhado por Silvia, dei uns bordejos pela cidade e pelo malecón, o calçadão de lá.

Paquera-se adoidado (paquera é teropo), se beijam no meio da rua, o mulherio é meio fornido (gordura demais na comida), bundudas. As pretas — para meu desgosto — esticam os cabelos, pintam as pálpebras de azul e usam (argh) bobs de rolo de papel higiênico. Não vi mendigos, viados e cachorros. Silvia não me explicou por quê. E como bebem os companheiros! Eu dava festas no hotel, tinha levado discos do Martinho, da Bethânia — eles adoram Bethânia.

Pelas quatro da manhã estava todo mundo de porre, eu dava bronca: “Sou um capitalista decadente, mas vocês a esta hora deveriam estar descansando para tocar esta revolução pra frente!” Sempre tinha alguém que explicava: “Compañero, mañana a las ocho estaremos todos em la oficina!” E capotava. Mas o fato é que às oito todo mundo estava dando duro. Pátria o muerte. Voltei outras vezes a Cuba, mas não era mais proibido e perdeu a graça.

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