Rio - Na tradicional abertura dos trabalhos da Assembleia-Geral da ONU, quarta-feira, a presidenta Dilma lamentou a ofensiva militar contra o Estado Islâmico em território sírio, liderada pelos Estados Unidos — frentes no Iraque já haviam sido atacadas. Dilma afirmou preferir a diplomacia, alertando para riscos de consequências nefastas ao que sobra após as investidas.
Há alguma razão na fala de Dilma, como se verá a seguir. Mas é muito custoso acreditar em diálogo com o Estado Islâmico, entidade altamente militarizada, fundamentalista e rudimentar, para a qual o mundo demorou a olhar com atenção. A ação mais chocante são os carrascos de preto decapitando jornalistas trajados de laranja, mas há mais atrocidades na conta dos radicais. Depreciam-se mulheres, ora apedrejadas, ora mutiladas, e cerceiam-lhes direitos. É um contrassenso a primeira presidenta da República do Brasil, uma das mais ferrenhas defensoras da igualdade de gênero, não atentar para esses crimes.
Difícil haver diplomacia também onde exsuda-se ódio, caso do Estado Islâmico, que o manifesta e o impõe às crianças de modo mais incisivo que a Al-Qaeda e similares. Não há o que negociar ali: os radicais querem a extinção dos valores do Ocidente e a morte de seus líderes. Em seu discurso, com despropositada e deselegante autobajulação com claros fins eleitoreiros, poderia ter demonstrado mais sutileza. Não ajudou o fato de Lula já ter bajulado Bashar Al-Assad, hoje um tirano que resiste às investidas de ‘rebeldes’. Não é o comportamento adequado de um país que não tolera ser chamado de “anão diplomático”.
De positivo na mensagem de Dilma, destaca-se apenas o fato de que pouco se atenta para os despojos dos conflitos. Acreditou-se por muito tempo que jogar bomba, tática norte-americana por excelência, era a solução para quaisquer males. Afeganistão e Iraque provam o contrário: das guerras ficaram nações estraçalhadas, territórios férteis para insanidades como o Talibã e o Estado Islâmico. Desta vez, porém, a ameaça é séria, com riscos reais de atentados.
Barack Obama parece estar mais cauteloso do que seu antecessor, George W. Bush, ao insistir numa coalizão para atacar o Estado Islâmico. Dividir a responsabilidade — ou a culpa —, porém, não basta. Além de evitar as possíveis lambanças de sempre, como vitimar inocentes, devem existir duas outras preocupações: não deixar a Síria e o Iraque mergulharem no vazio e no caos e saber conter, com contrainteligência e transparência, a guerra ideológica. Do contrário, será um enxugamento de gelo com consequências imprevisíveis.