Rio - Terminada a temporada eleitoral, começa a semana com presidente e governador eleitos. Alegria de uns, tristeza de outros. Lá se foram sonhos de chegar ao poder por água abaixo. Milhões de interesses estavam em jogo. Por um lado, negociações das mais diversas visavam à continuidade no poder; do outro, planos para o novo partido assumir a nação e, com isso, novos personagens na gestão do país.
Nesse paralelo, nós, o povo, assim como eles, também construímos justificativas para nossos eleitos a partir de interesses pessoais. Todos tinham razões secretas para escolher. Alguns tiveram coragem e revelaram seus preferidos; amigos se desentenderam, se ofenderam e se decepcionaram. Há muito tempo não vivíamos uma eleição como esta, com disputas e paixões tão acirradas.
Os artistas que entendem que seu apoio ajuda a decidir quem será eleito deixaram claras suas escolhas. São pessoas públicas, formadores de opinião que, obviamente, as justificam por interesses profissionais, não os da nação. O prejuízo? Deixam grande número de fãs frustrados. Racham o fã-clube, traem ideais neles depositados. Comprometeram-se, é dinheiro em primeiro lugar. Afinal, têm projetos em andamento, apostam, dependem da captação de verba para suas realizações.
Alguns aconteceram no governo Dilma. Construíram, solidificaram suas carreiras ao longo dos anos de PT. Natural que sintam a dívida. Só um porém: com as preferências, vem a desconfiança de quem tem interesse no caso. Acreditam e confiam realmente no partido ou querem, assim como eles, permanecer na política e continuar a ser beneficiados nos seus projetos artísticos e, por que não, pessoais? Não importa a resposta, apenas a especulação, constatação sem crítica. Natural que aconteça, somos interesseiros mesmo!
No meio artístico é sabida a dificuldade para captar verba via Lei Rouanet para pequenas produções; facilidade para os grandes nomes, os amigos do Rei. É a lei do mais forte. Os menores ficam chupando dedo. O tráfico de influência é prática antiga, imune na mudança presidencial. São capitanias hereditárias. Mudar de ideologia resolve a situação junto à mudança de partido, só não pode é faltar dinheiro.
Mas imaginemos quem errou na aposta? Como fica aquele que apoiou um candidato, e ele não foi eleito? Como será bater na porta de dada estatal, sitiada por determinado partido do candidato que não foi o apoiado, para pedir ajuda depois de ter revelado voto em público e perdido a aposta? Vira a casaca? É jogo de azar? Pode ser. Às vezes, dá zebra. Mas tudo se ajeita com novas alianças e com a cara de pau — além da memória curta.
A culpa em relação à facilidade para captar dinheiro público para projetos artísticos não é só dos medalhões, não são culpados sozinhos. É também das empresas que têm o poder de investir em quem quiser. Decidem o que vai ou não a público. Apesar da qualidade do espetáculo, vale o famoso ‘quem indica’. Funcionam como censura ou jogo de cartas marcadas. Querem seu nome sempre associado aos grandes ídolos, os amigos do Rei, em detrimento de espetáculos menores, mas não em qualidade. Fica a questão, a desvantagem e o lamento eterno dos não famosos.
O fato é que, quando acontece mudança de partido no poder, há desarticulação de esquemas pré-estabelecidos, que causam risco para o apostador que perdeu o investimento no candidato, e ninguém quer esse problema. Isso o deixa em maus lençóis. Já a permanência do PT no poder garante a quem apostou no partido garantia e continuidade de seus projetos. Como num jogo, sempre se perde, sempre se ganha e a ciranda continua sempre se refazendo.
E você que me lê, ganhou ou perdeu com o resultado final das eleições?
Fernando Scarpa é psicanalista