Por bferreira
Rio - Feliz Natal a todos, seja lá o que isso signifique! Todo mundo deseja, mas sem muita consciência do que está dizendo. Os acontecimentos não sopram a favor: vejamos esse quase fim de 2014, véspera de Natal, pós-eleições. O cenário é triste, foge dos tons verdes, vermelhos e dourados, não tem neve nem está frio, o tempo está fechado, cinza. Natal catastrófico, recheado de situações inusitadas que comprometem o desejo de felicidade. É de tirar o fôlego falar nisso hoje em dia. Estamos afetados, machucados e tristes.
O país explodiu em corrupção, a Petrobras desceu ladeira abaixo, e o dólar foi às alturas. Os EUA acabam de reatar com Cuba. Tem até Obama falando em espanhol. Quem diria? O ministro português foi preso por desvio de verba. Por aqui, o Bolsonaro perdeu a linha falando em estupro, se mostrando macho e doido, e pode ser cassado. Falta água e, no meio desse calor intenso, mães esquecem filhos que morrem trancados dentro do carro ao sol. Está tudo doido, desregulado. Na televisão, o psicopata resolve contar, sem a menor cerimônia, em pleno período de Natal, o prazer que sente em matar e o mal-estar de não fazê-lo. Assim não dá! Nesse climão, desejar “Feliz Natal” vira ironia. Bobagem! A frase sai sem sintonia com o que estamos vivendo: é condicionamento, só pode ser.
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Para desejar e sentir o tal “Feliz Natal”, é fechar os olhos para tudo isso. Olhar mesmo só para as luzes da Árvore da Lagoa, que piscam entregando a farra do consumo. Resta sentar à mesa cheia — para os que podem. Para os que não podem, paciência. Sempre se come algo nas ruas, até restos de sanduíche das lixeiras pode virar ceia, jantar. Mas essa lembrança dói e, porque dói, é melhor esquecer. Afinal, não dói em nós, dói neles, naqueles. Certo? Claro que não, ironia apenas, a coisa é feia, triste.
É Natal, vamos ao vinho, abrir os presentes, desgostar de alguns, nos reconciliar com alguém, brigar, ser a vítima do amigo oculto — que te deu presente tamanho G, e você odiou mas acabou disfarçando. Passada a troca de presentes, é partir para a ceia com a parentada, os desejados, os indesejados e os inevitáveis desgarrados de última hora.
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Segue mais uma noite de comes e bebes, tocados pelo álcool e pelo espírito natalino. Somos coagidos à felicidade. É como dar um ‘pause’ na consciência. Caso contrário, ninguém aguenta! Contudo, é Natal. Vale não esquecer: a expectativa é grande, a noite, curta, nem sei se vale a pena! Mas...vamos fingir que está tudo bem? Feliz Natal! Não é assim?
Fernando Scarpa é psicanalista
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