Por bferreira
Rio - O espírito natalino até que seria muito bom se durasse depois do Natal. O problema é que o Natal é só um dia. Nesse dia, durante uma guerra, é comum acontecer uma trégua, para recomeçar a matança depois. É uma data em que a solidariedade e a fraternidade se transformam em obrigação, para depois voltar ao mundo real.
Não gosto do Natal por ser uma festa de escandaloso apelo de mercado, onde o mais importante é dar e receber presentes e promover belos jantares, onde poucos têm de mais e muitos nada têm. É uma época de falsas gentilezas.
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É comum ouvirmos as lojas anunciarem promoções e orientarem as pessoas para que façam o maior Natal de suas vidas, comprando brinquedos e guloseimas. O Natal é uma festa de aniversário estranha, na qual, muitas vezes, o aniversariante não participa nem é lembrado.
Existe um conto no livro ‘Os Irmãos Karamazov’, de Dostoievski, que fala sobre a aparição de Cristo em Sevilha, na Espanha, no século 16, na Inquisição. Uma força curativa emanava de seu contato, e milagres aconteciam à sua volta. De repente, surge um guarda e arrasta Cristo para a prisão por perturbar a ordem.
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Lá dentro, um inquisidor encara o prisioneiro e pergunta: “Quem és tu? Por que vieste nos atrapalhar? Não digas nada. Cala-te! Não tens o direito de falar mais nada do que já disseste outrora. Amanhã eu te condenarei e serás queimado.”
O chefe da Inquisição faz um discurso onde afirmava que só uma mentira organizada e institucionalizada poderia garantir a ordem e achava absurda a ideia de que cada homem pudesse ser senhor de seu destino. Cristo ouvia. De repente, ele fitou seu inquisidor nos olhos e o abraçou. O inquisidor ficou surpreso e assustado. Ele abriu a pesada porta e apontou a saída: ‘Vai embora! Vai e não volta nunca mais para nos perturbar’.
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O prisioneiro saiu da cela e desapareceu na noite escura. Se Cristo aparecesse em uma noite de Natal em nossa época, talvez a história tivesse o mesmo final, mas, um dia qualquer, poderá ser diferente. Nesse dia, teremos um verdadeiro e duradouro Natal.
Célio Pezza é escritor
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