Por felipe.martins, felipe.martins
Rio - Internauta amador, mas diário, encontro no Facebook um curta-metragem do diretor Jom Tob Azulay registrando, sem a pretensão de conceito, câmeras e filtros, o cotidiano do craque João Nogueira, até hoje um artista insubstituível. O filme se chama ‘Carioca Suburbano, Mulato Malandro’, treze minutos de uma vida dedicada ao samba, à música e seu estado de espírito.
João abre o portão da sua casa no Méier, invadida e empossada como Clube do Samba, onde uma galeria de compositores definitivos pra nossa memória cultural o aguarda com copo e prato na mão. Revejo o documentário quadro a quadro. Alguns dos presentes tive o privilégio de conviver. Outros ainda me orgulham de compartilhar. Foi o meu querido Helio Delmiro quem me apresentou ao anfitrião desse evento.
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Era meados dos anos 70, eu, um aprendiz de violão, enfeitiçado pela sonoridade carioca que produziam, passei a seguir o artista em suas caminhadas no bairro. Na Rua Dias da Cruz, ainda cinema Imperator, havia o restaurante El Chopp na entrada. Eu me aproximava o possível pra copiar os gestos do homem no trato com as tulipas. Claro, não existia a desculpa da selfie ou a segunda foto no celular da moda.
Frequentava também na Silva Rabello, muito antes de se batizar o termo ‘Baixo Meier’, a tradicional Taberna Don Rodrigo. A pedida era rã à dorê. Assisti a shows no Club Mackenzie e na Churrascaria Gargalo. Babava, não na gravata, mas no uniforme da vida. Ainda falando dessa ‘sessão de cinema’ na famosa rede de seguidores e status, se destaca a participação do amigo e jornalista Sergio Cabral. Sergio traduz em uma frase o estilo desse “carioca suburbano” — sambista de calçada. João tinha a sonoridade do Rio de Janeiro.
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A música, sempre ela, me presenteou com o convívio. Em 1995, dividi o palco do Teatro João Caetano, projeto Seis e Meia, com essa figura carismática. Tocamos juntos em São Paulo, Curitiba, compomos, mais amigos, um dos sambas pro bloco Clube do Samba, até desfilar no Carnaval. Deu tempo de esbarrar na Lapa, aonde bebemos o que foi possível pelos botequins mais vagabundos. Pequenos detalhes ao seu lado moldaram mais a minha identidade. Em disco, ao vivo, penso que sua última participação foi em 2000 no CD ‘Pirajá­Esquina Carioca’, gravado no Tom Brasil, São Paulo, um momento emocionante da minha carreira.
Sinceramente, não sai da lembrança o telefonema que recebi numa madrugada de outono, avisando da sua partida. “A dor sobe pras trevas, o nome, a obra imortaliza”. Vou entrar 2015 no máximo volume, me embriagando com esse ‘mulato malandro’.
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