Por bferreira

Rio - Meu pai, um argentino alegre que faliu na ditadura da Argentina, ensinou-me que eu ganharia qualquer dinheiro, mesmo com o trauma de ser herdeira de quem perdeu tudo, se trabalhasse com paixão. Pior do que falir, na cabeça de meu pai, era ter uma filha reacionária. Minha mãe, brasileira, tão progressista como ele, teria muita vergonha de mim (e minha avó, paraense, mais ainda) se, em pleno 2015, saísse por aí a bater panelas e a defender retrocessos.

A convivência com parentes e amigos que sofreram com o golpe me ajudou a entender melhor os conceitos de processo histórico, explicados por cientistas sociais.

Dilma e Lula podem até ter errado (Brizola e Darcy não errariam tanto), assim como erraram FHC e, mais ainda, Collor, na questão de controlar a corrupção (doença do capitalismo mundial). Mas reivindicar um golpe que nem os militares querem mais dar, isso é um absurdo.

Essa espécie de ‘Marcha da Família com Deus pela Liberdade’, depois de anos de lutas pelas Diretas Já, por mais maquiada e badalada que tenha se apresentado, faz com que as memórias surjam, mesmo que não queiram.

Marx, Engels, Eric Fromm, Freud e Wilhem Reich, entre outros, explicam tudo em suas obras. Sobre as classes médias recalcadas que desejam o poder, mas não mudam nada. Panelaços não são revolucionários.

Minha avó, ligada a JK e a Jango, tinha horror às mal-amadas de Carlos Lacerda, no Rio, e às paulistas metidas a besta que ajudaram o padre irlandês Patrik Peyton (ligado à CIA, aos imperialistas e à direita ) a organizar a a tal da marcha em São Paulo, a 19 de março de 1964, dias após o Comício da Central. A manifestação que ajudou a derrubar Goulart usou o nome de Deus para implantar um regime que matou e impediu o Brasil de seguir em frente.

As mulheres reacionárias que vi na infância (tinha 6 anos em 1964) eram parecidas com as de hoje. As de 64 usaram terços e crucifixos para pregar o golpe contra Jango, “comunista ou ateu”. A única diferença entre hoje e 64 é que agora não haverá golpe. Nem impeachment. Mas temos que tomar cuidado com as mulheres reacionárias. E com os homens influenciados por elas.

Yacy Nunes é jornalista

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