Por adriano.araujo

Rio - Há poucos dias, os desembargadores Gilmar Augusto Teixeira e Elizabete Alves de Aguiar decidiram libertar os jovens Fabio Raposo e Caio de Souza, que estavam presos no Complexo Penitenciário de Bangu. Em meio a uma manifestação realizada em fevereiro de 2014, um deles pegou e o outro acendeu o rojão que atingiu a cabeça do cinegrafista Santiago Andrade, da Band, causando a sua morte. Os magistrados interpretaram que, ao acender o artefato, os rapazes não assumiram o risco de matar alguém, mesmo que por pura imprudência. Uma tese no mínimo surpreendente, já que qualquer adulto em sã consciência sabe dos perigos de soltar um rojão próximo de outras pessoas.

A decisão sobre Caio e Fabio ainda será tratada em recurso, mas dá um ótimo pretexto para discutir o rigor da sentença de um outro rapaz, também preso durante as manifestações. Em junho de 2013, Rafael Braga Vieira, de 27 anos, foi para a cadeia por ação violenta durante um protesto. Alegou inocência, mas não adiantou. A principal prova contra ele foi uma garrafa plástica de Pinho Sol, que segundo PMs seria usada para fabricar um coquetel molotov.

Bastou isso para que Rafael fosse condenado — entre centenas de manifestantes presos durante aqueles protestos, ele é até hoje o único em todo Brasil a receber condenação. A sentença foi dada mesmo diante da reconhecida impossibilidade de se produzir molotov com uma garrafa plástica. Essa contradição gritante não pesou em nada para absolvê-lo.

Rafael é um rapaz negro, morador de rua, que vive de bicos e já tinha sido preso outras duas vezes por roubo. Ao contrário de Caio e Fabio, ele nunca teve qualquer participação política, não sabe o que quer dizer a expressão “black bloc” e não entende ao certo os motivos que levaram tanta gente a protestar nas ruas. Dos três, é disparado o mais pobre (Fábio, na verdade, pertence à classe média).

Sabe-se que são diferentes os autores das sentenças, mas deve ser difícil para o cidadão comum entender a disparidade de parâmetros. Como explicar a um leigo que a Justiça que coloca em liberdade dois jovens cuja ação resultou na morte de alguém é a mesma que mantém em uma penitenciária outro rapaz cujo único crime comprovado foi carregar uma garrafa de Pinho Sol? Ou há muito rigor de um lado ou muita benevolência do outro. Pelo bem de Rafael e de toda a sociedade, esperemos que a balança da Justiça torne-se, algum dia, mais equilibrada.

E-mail: chico.alves@odia.com.br

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