Por bferreira

Rio - A democracia na América Latina é fenômeno relativamente recente e sujeito a diversas interpretações, dos mais variados matizes. Seu aprofundamento trouxe a reboque o desenvolvimento das instituições políticas e o aumento da participação popular, inaugurando o período democrático mais longevo de história. Mas salta aos olhos a recorrência de crises políticas e quedas de presidentes na região.

Desde 1990 as crises presidenciais se intensificaram — apenas quatro anos não registraram a ocorrência desses eventos (1996, 1999, 2009 e 2011). Contudo, não devemos ver tais acontecimentos de maneira negativa, muito pelo contrário. Se no período autoritário não havia tantas crises, tampouco havia democracia e liberdade.

Nem todas as crises ocorrem do mesmo jeito. Ao longo dos anos 1990 e no início da década seguinte, grande parte dos presidentes eleitos com plataformas de centro-esquerda e que ‘traíram’ a confiança de seus eleitores, governando na direção de políticas públicas e coalizões típicas de centro-direita, acabou deixando o poder. Nos anos 2000 ocorreram importantes mudanças nesse cenário, com a vitória de mandatários que defendiam pautas consideradas progressistas e que, uma vez no poder, implementaram ações que reafirmavam seus compromissos de campanha. Um dos principais resultados dessa mudança foi a maior estabilidade política e presidencial na região.

Contudo, devemos refletir sobre três casos recentes em que isso não aconteceu: o ‘golpe cívico-militar’ que resultou na deposição de Manuel Zelaya, em Honduras, em 2009; o malfadado golpe policial de 2010 contra Rafael Correa, no Equador, e o ‘juízo político express’ que derrubou Fernando Lugo no Paraguai em 2010. Podemos encarar tais eventos como nova estratégia de golpes ilegais das elites conservadoras e antidemocráticas na região.

Provável explicação se encontra na percepção e na aprendizagem desses grupos de que o sistema político dos países latino-americanos, ao longo das últimas décadas, geralmente voltava ao equilíbrio depois de longos períodos conturbados somente após a queda dos mandatários. Conscientes de que não poderiam contar com amplo apoio popular para isso, se uniram a setores oposicionistas dos respectivos Congressos e das Forças Armadas para efetivar suas ações, realizadas de forma eminentemente extraconstitucionais. Dito isso, cabe a pergunta: será o Brasil a próxima bola da vez?

André Coelho é doutor em Ciência Política e professor da Unirio

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