Rio - Nonno, o taxista, cruzando as sinuosas curvas da Candido Mendes, percebe um carro enfumaçado da mala ao capô, e corre, porta aberta, em socorro ao motorista que rodeia o veículo sem a pressa do voluntarioso. Surpreso, encontra o gaiato rodopiando um defumador prateado, alças em correntes, balbuciando pedidos de proteção. O aroma de babosa, alecrim e anis estrelado, dizima qualquer dúvida: “Rebate falso. Fogo só nas velas da encruzilhada”.
Desanimado, São Pedro desabafa: “A maré não tá pra peixe”. Correr na Lagoa, só na marca do Usain Bolt. De bicicleta, nem as 12 marchas te salvam dos bandidos de plantão. Imagino que na época das diligências, John Wayne e seus desfiladeiros, a certeza da emboscada fosse menor.
Lenço amarrado, cobrindo meia face? Desnecessário. Roubase na cara limpa. Ando pelo Arpoador visitando o palco do show que faremos hoje em comemoração ao Dia do Trabalho. Não há uma nuvem que nuble os Dois Irmãos. Nanda. Mar ideal pra receber refugiados, o perigo está na calçada. Sou apontado com os olhos como se usasse camisas floridas, estampas de araras e coqueiros que dão cocos, bermuda e meias soquetes. À minha volta, os reais turistas estão camuflados de moradores de rua, sugestão do guia. A blusa com furos de uso, confeccionadas num pano de chão, expõem a grife do medo. Até os cabelos, durante a ‘vacance’, são tratados a sabão português. Em resumo, a sensação é que, além dos perfumes, também importamos mendigos de Paris.
Sumiram os óculos do Michael Jackson e do Renato Russo. Nilcemar Nogueira, neta do mestre Cartola, organiza uma vigília protegendo os aros escuros do avô na estátua de Mangueira. Não é à toa que instalaram câmeras de segurança no banco aonde o Carlos Drummond de Andrade bate ponto em Copacabana. Vivia cegueta. Longe da leitura, do papel almaço, era vítima desse fetiche carioca, surrupiar os óculos fundidos no bronze. Que se cuidem os ídolos Ray Charles e Araci de Almeida, morou? Não sei se acordamos com sol, rezo por isso. O trabalhador brasileiro é um herói. Educadores, bancários, diaristas, garis sorrindo na caçamba do caminhão. Assardinhados nos coletivos, são descontados quando o trem atrasa e nem os memorandos da Central existem mais. Hoje é dia de o subúrbio por a cadeira na calçada, improvisar com tijolos e prateleira de forno o churrasco dos amigos, som alto no carro aberto e muita cerveja gelada.
Na Zona Sul, com sorte, água morna, marolas e areias tranquilas. Sufoco? Só o de andar descalço até a margem onde moram os tatuís. Imagino as barrigas no entorno dos botequins. Conversa de único enredo: “Paz na cidade abençoada por Deus e bonita por natureza”.
E-mail: moaluz@ig.com.br