Rio - A cerimônia do Oscar este ano registrou fato inusitado. Dois dos agraciados com o mais importante prêmio do cinema fizeram questão de mencionar em seus discursos de agradecimento suas impressões sobre tema pra lá de delicado: o suicídio. Vencedora na categoria melhor documentário, Dana Perry dedicou o prêmio ao filho, que se matou ainda adolescente. “Nós precisamos falar claramente sobre suicídio e trabalhar contra o estigma e o silêncio em relação ao assunto, não varrendo o problema para debaixo do tapete”. Minutos depois, o vencedor do Oscar na categoria melhor roteiro adaptado, Graham Moore, revelou ao mundo que havia tentado se matar aos 16 anos porque se sentia estranho, sem sensação de pertencimento. Dedicou o prêmio a todas as pessoas que se sentem assim e pediu que “permanecessem firmes”.
É possível que muita gente tenha estranhado o tom dos discursos, ou achado imprópria a abordagem em uma noite festiva. Com certeza essa não foi a impressão da Organização Mundial da Saúde, que luta contra o tabu em torno do suicídio para que seja possível reduzir o número de casos. A OMS divulgou recentemente relatório informando que o suicídio é caso de saúde pública no mundo com 804 mil ocorrências por ano, 2.200 por dia, um óbito a cada 40 segundos. O Brasil ocupa a 8ª posição na lista, com 11.821 casos por ano, 32 por dia.
Para a OMS, é importante abrir espaços na sociedade e na mídia para lembrar a gravidade do problema, e principalmente, reforçar a informação de que o suicídio é prevenível em 90% dos casos, quando há relação com patologias de ordem mental diagnosticáveis e tratáveis, como o transtorno de humor, ou a “depressão”. O Ministério da Saúde, por sua vez, reconhece que é preciso avançar muito na direção de redes de cuidado, melhorando o atendimento nos CAPs (Centros de Atenção Psicossociais).
Enquanto a rede pública pena para oferecer atendimento de qualidade, o CVV (Centro de Valorização da Vida) vem realizando há 53 anos, gratuitamente, serviço voluntário de apoio emocional e prevenção do suicídio pelo telefone 141 com reconhecida credibilidade. Há muito o que avançar. Mas primeiro, é preciso vencer o tabu.
André Trigueiro é jornalista