Por paulo.gomes

Rio - A ‘Alegoria da Caverna’, livro 7 de ‘A República’, tem importância decisiva no pensamento de Sócrates. Ao perseguir a Ideia do Bem, identifica virtudes humanas de que os sofistas conhecem apenas sombras disformes. O mundo é uma imensa caverna tomada pelas trevas de que são prisioneiros todos os homens. Acorrentados no fundo da caverna, os homens veem longe uma luz que rasga o teto e sombras projetadas nas paredes irregulares, sombras de deuses, de homens, de animais, de objetos.

A caverna é a ignorância, a luz é o conhecimento. O homem tem que se libertar das trevas. Mas as trevas são o ambiente que o homem conhece, a sua segurança, por pior que seja a circunstância. “Eu sou minha circunstância; sou o mundo que me circunda”, diz Ortega y Gasset.

Conformar-se é submeter-se às trevas. O mundo não se limita ao entorno dos pés de quem o contempla. O umbigo não é o centro do mundo, ao redor de que tudo gira e se conforma. É preciso ser senhor de seu destino, e não escravo de suas circunstâncias.

Como ser outro se na caverna as sombras protegem e nada é necessário porque tudo é suficiente? Não há maior segurança que nos líquidos do ventre materno. Mas a mãe precisa induzir o seu produto mais nobre a uma nova circunstância de riscos e de oportunidades. Não há oportunidades nem conquistas sem riscos.

A verdade não é a expressão de meras sombras distorcidas que escorrem pelas paredes das cavernas em que nos refugiamos. Sair da caverna significa libertar-se, romper limites, conviver com o novo, ser outro a cada dia, aprender a aprender, perder, sofrer, temer, superar fantasmas, conquistar, inconformar-se com a sua circunstância.

A caverna está dentro de você. Liberte-se. Mas não basta o sair da caverna, o conhecer a luz, o assumir nova circunstância apenas individualmente. O homem que se liberta das trevas deve voltar e tentar libertar os que continuam prisioneiros das trevas. “Governar é remediar os males alheios”, diz Sócrates. Portanto, não pode governar aquele que tenha que remediar os seus próprios males e que continue prisioneiro nas trevas da caverna imensa.

Panta rei.

Ruy Chaves é diretor da Estácio e da Academia do Concurso

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