Rio - Não são só os negros, os gays e os gordos que sofrem preconceito neste mundo que a gente vive. A mulher sozinha, solteira, é alvo preferencial também. Principalmente das outras mulheres. Não é raro, pra dizer a verdade é até comum, um casal conservador dar um almoço ou um jantar e excluir, ainda que tenha simpatia pela criatura, uma mulher solteira ou descasada da sua lista de convidados. E não estou aqui falando de mulheres tipo periguetes ou sem noção. Estou falando de mulheres com vida própria, independência financeira, respeito profissional e traquejo social. Por que é que as mulheres não casadas incomodam tanto?
Porque não tem o “capital marital”, me responde a antropóloga Mirian Goldenberg, que está lançando mais um livro (‘Sexo’, Editora Record), numa roda de conversa que tivemos esta semana. Estas mulheres são vistas como “diferentes” e esta diferença incomoda, principalmente à outra mulher, mas também aos que não gostam do diferente, do que foge ao padrão onde se enquadra também, além da mulher que não casou, a mulher que não tem filhos, que não pinta o cabelo, que usa biquíni na praia ou na piscina mesmo tendo mais idade ou sendo gorda. Basta lembrar o recente episódio que aconteceu com a atriz Betty Faria quando foi muito criticada nas redes sociais por ir à praia de biquíni, apesar de magra, apenas por estar na faixa dos 70 anos. “Queriam que eu viesse de burka?”, respondeu a inteligente atriz.
Também é muito frequente, nos restaurantes, quando duas amigas almoçam ou jantam sozinhas, o garçom ou um amigo que aparece, perguntar: “Vocês estão sozinhas?” Não, estamos jantando uma com a outra. Ir ao cinema também desperta crítica e pena. De novo, a falta do “capital marital” se faz presente.
Nesta mesma roda de conversa, a pedagoga Elizabete Regina de Oliveira falou dos assexuados, aqueles que não têm interesse sexual. Ela vem estudando este assunto há alguns anos e constatou que há um número expressivo de pessoas que não se identificam com a realização amorosa, desde os tempos de colégio, mais ou menos na altura da terceira série, quando o interesse sexual surge na vida de quase todo mundo, até a idade adulta. Numa sociedade sexualizada como a nossa, esta não vontade ou não desejo é pecado mortal, motivo de sofrimento, e faz com que muitas destas pessoas, de 15 a 59 anos, se casem.
Há também pessoas que, mesmo casadas ou vivendo junto, não gostam ou não fazem sexo, por opção. Elizabete me contou também que há vários grupos de assexuados que ganharam voz nas redes sociais. Nas mesmas redes onde a crítica ao comportamento do outro é tão ácida. O que reforça a tese de que as redes podem ser democráticas e o ser humano é, com certeza, uma eterna caixinha de surpresas.
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