Por bferreira

Rio - Aprendi que Marx os chamava de exército industrial de reserva. Apesar de servir a um objetivo vil, manter baixos os salários, esse pessoal até sobrevivia, de vez em quando arrumava trabalho. Depois, na onda neoliberal, as coisas pioraram, passaram a não servir de reserva para nada. Houve quem chegasse a qualificá-los de descartáveis. Outros passaram a rotulá-los de sobrantes. No bojo do debate sobre a redução da maioridade penal, o tema das pessoas descartáveis se impõe. Afinal, quem são aqueles que a sociedade está querendo punir? Os filhos da classe média de Ipanema? Os alunos do São Bento ou do Santo Inácio? Não!

Infelizmente, são pouco ouvidas as vozes a propor alguma quebra das barreiras que vedam a ascensão mínima dos jovens sobrantes, possivelmente moradores dos subúrbios e das periferias. Melhorar o ensino de forma radical poderia ser ao menos parte da solução, mas isso, entra ano sai ano, permanece no rol dos objetivos irrealizáveis, uma espécie de “prometo não mais pecar” dos católicos.

Não surpreende, portanto, que minha esposa, professora do ensino público estadual, tenha ouvido da turma: “Professora, não se preocupe tanto com a gente. Pra onde a gente vai, ninguém vai precisar de Inglês. Nosso destino já está definido: qualquer dia a senhora vai ver a gente no Datena”. Esse episódio causa uma dor pungente, pois revela que o mundo atual retira de um segmento da população seu mais valioso patrimônio: o sonho.

Não pode ser usada como argumento a história do garoto pobre que ficou milionário (talvez por ter se tornado jogador de futebol ou cantor). A grande massa continuará na miséria. No mundo do capital, para que exista um Silvio Santos, é necessário que o resto seja plateia do Silvio Santos.

Claro que, como qualquer cidadão, eu me preocupo — e muito! — com a segurança. Também sei que há, entre os menores delinquentes, alguns incorrigíveis, psicopatas, que merecerão cuidados especiais. De duas coisas, porém, estou certo. Primeiro: a redução da maioridade penal, de modo a trancafiar o contingente descartável, não vai resolver nada. Segundo: lá no fundo, tal medida me faz lembrar de uma tal de Solução Final, aquela projetada por Hitler para exterminar os judeus.

Francisco José Ferraro Genu é auditor fiscal da Receita Estadual

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