Por bferreira

Rio - Conta-se que Cesar viajava muito em razão das guerras que comandava para ampliar e manter o Império Romano. Sua mulher, Pompeia, ficava muito sozinha no palácio, mas mantinha-se fiel ao imperador. Certa vez o palácio foi invadido por um admirador dela, Clódio. Preso pelos guardas, foi levado a julgamento, mas acabou absolvido porque Cesar testemunhou em favor da esposa.

Contudo, Cesar passou a tratá-la com indiferença, como se ela tivesse culpa pela ação do penetra. Indagado sobre sua possível contradição, Cesar respondeu: “Não basta que a mulher de César seja honrada, é preciso que sequer seja suspeita.” Essa lógica, retirada da pátria-mãe de nosso Direito, tem sido aplicada rigorosamente contra mulheres e familiares de autores de crimes. A ação delituosa, que não pode passar da pessoa do agente, tem sido aplicada arbitrariamente a terceiros que nada têm a ver com fatos criminosos.

Práticas como essa e a do dedo-durismo, tão aplaudidos nessa quadra de abusos aos direitos humanos, devem ser repudiadas por não estar em consonância com os princípios constitucionais em vigor. Policiais e membros do Ministério Público tem- se utilizado dessas práticas de coação de familiares como forma de apuração de responsabilidades dos reais autores dos delitos.

A criminalização das relações familiares, que já é realidade consagrada através da Lei Maria da Penha, toma outras formas nas investigações policiais — seja através da invasão indevida de domicílios, seja no acautelamento imotivado de companheiras com graves repercussões na vida dos filhos. Estes se veem privados do convívio familiar por práticas de investigação que, mesmo não tendo amparo na legislação, recebem aplausos da mídia deformadora da opinião pública.

Essa é mais uma forma cruel de vitimização de mulheres, muitas delas de origem humilde e sem qualquer relação com a criminalidade, mas que acabam punidas pelo ‘crime’ de haver se apaixonado por homens que são ou tornaram-se autores de crimes. Essa fidelidade é comprovada pela presença constante de mulheres, companheiras e mães na visitação nos presídios, o que não ocorre com a mesma qualidade e quantidade quando as presas são as mulheres.

Siro Darlan é desembargador do TJ e membro da Associação Juízes para a Democracia

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