Rio - Betinho dizia que “quem tem fome tem pressa” e, no nosso caso, quem tem filme tem pressa também. Seu filho Daniel e Angela Zoé, da Documenta Filmes, me fizeram o convite irrecusável para dirigir o documentário. A ideia era não só fazer um filme para homenageá-lo, mas imortalizar sua história para o público jovem, que não teve chance de conhecê-lo após sua morte, em 1997. Depois de amanhã Betinho faria 80 anos.
A experiência de lidar com uma presença humana e histórica que transcendia a noção de personagem foi instigante. Os fatos da vida de Betinho, duelando com a morte desde o nascimento, crescendo entre uma penitenciária e uma funerária, e depois enfrentando a tuberculose, a clandestinidade, o exílio e a Aids, até virar símbolo nacional, soariam exagerados em qualquer roteiro de ficção. Com a admiração pessoal e identificação que tenho com suas causas, optei por avançar, sem reverência, didatismo ou pieguice em direção ao homem que retratava.
Nesse caminho, buscamos o máximo de material de Betinho narrando a própria história. Assim, além do Cedoc da Globo, chegamos aos arquivos de uma entrevista com ele feita pelo Alfredo Alves para uma série de TV. Conseguimos acesso ao material bruto, decisivo para criar diálogo atemporal com os depoimentos que filmei no presente. Uma das sensações que me atraem no filme é a de que Betinho está vivo, aqui do lado, tomando uma cerveja e conversando conosco. O Cinema faz a sua parte.
Se este documentário fosse feito há três ou cinco anos, seguiria sendo a narrativa de uma figura essencial da História do Brasil, o nosso Gandhi, o nosso Mandela, símbolo e referência necessária para um país que cultua tantos atletas e artistas — e poucos homens públicos. Hoje, no olho de mais um furacão, este se tornou um filme urgente. Seguimos equilibristas entre a Vida e a História, na gravidade do Tempo, matérias-primas do Cinema.
Depois do prêmio de Melhor Documentário pelo Voto Popular no Festival do Rio, partimos para o circuito, e ouso dizer que poucas comédias românticas, ou filmes de ação em cartaz, podem oferecer emoções mais genuínas e fortes do que este mergulho na vida de Betinho, e nos desafios da democracia no Brasil.
Victor Lopes é diretor de ‘Betinho - a esperança equilibrista’