Rio - Quando o fotógrafo francês Vincent Rosenblatt, 41, chegou ao Brasil para um intercâmbio, há 15 anos, não imaginava que o funk se tornaria uma das paixões de sua vida. Hoje, 400 bailes depois e com milhares de cliques arquivados, Vincent prepara uma exposição com as fotos que fez pelas favelas do Rio e um livro, ainda a ser editado.

“Eu achava que o Estado usaria o funk para conquistar os jovens nestas comunidades”, diz ele, crítico da repressão ao ritmo após a implantação das UPPs. “No Bronx e no Harlem, jamais usariam um blindado para destruir uma festa.”
Vincent sabe do que fala. A cena que mais o marcou nas suas incursões pelas favelas foi a de um caveirão destruindo as caixas de som do baile da Chatuba, no Complexo da Penha. Nada disso, porém, o fez desistir do ritmo e da identificação com a resistência dos moradores das comunidades.
“Pela música você sabe o que está acontecendo numa favela”, conta o francês, que começou a se interessar pelo batidão ao escutar, de Santa Teresa, o ritmo bombando no Santo Amaro. Intrigado, foi ao Castelo das Pedras e assistiu ao seu primeiro baile. “Conheci o organizador do baile, contei minha história e pedi para fotografar. Ele aceitou e nunca mais parei”, diz.
GALERIA: Funk em alta resolução
Hoje, o mais difícil para Vincent é conciliar os pedidos dos amigos para clicar as festas. No horizonte está a digitalização de suas fotos, feitas quando a revelação no papel tinha mais qualidade. Desta época, ele guarda as lembranças das viagens que fez pelo Brasil dormindo em redes e entrando em favelas.
Numa delas, o Santa Marta, começou a ensinar fotografia para jovens moradores, no projeto ‘Olhares do Morro’. “Fotografar as favelas não me bastou. A midia impunha estereótipos, fotografava de longe, com teleobjetivas, e mostrava apenas jovens armados. A favela precisava ter pessoas oriundas de lá para mostrar o cotidiano, as lutas, a riqueza cultural.” O projeto formou, entre outros, Tandy Firmino, fotógrafo da ONG Nova América, que foi à França com a exposição; e Ivanildo Carmo dos Santos, que foi à Suécia. Ambos foram com a série de exposições feitas com seus trabalhos pelo continente europeu. “Foi a paixão pelo projeto que me fez ficar no Brasil”, relembra.

A importância do funk para os moradores de periferias é uma ideologia. “O funk está no contexto de quem não quer viver massacrado”, conta. “Publiquei fotos de bailes até no Paquistão.” Segundo ele, cada baile é único, especial. Seu olhar levou o batidão para diversos países europeus em forma de exposição. Vincent faz ainda freelancers para revistas do Velho Continente.
“O baile funk é como uma galáxia. Tem lugares em que voltei mais de 20 vezes.” A marginalização do funk ainda o incomoda. Hoje, sua luta é para regularizar o baile da Chatuba.
‘O baile vive sem o tráfico’
Desde 2010 o batidão não ronca mais na Chatuba. Quando a UPP chegou, o baile, que para a polícia dependia do poder paralelo, foi proibido. Byano DJ, que tocava todos os sábados, garante que não era só isso — os comerciantes ajudavam. “E ele pode voltar sem o tráfico”, garante o DJ, que ganhou um edital da Secretaria de Estado de Cultura para promover três bailes na favela. “É uma tristeza ver a quadra vazia. O Bope quebrou tudo. Vinham 5 mil pessoas de todos os cantos. No último, contei 42 ônibus.”

Os comerciantes também perdem. Byano conta que eram 150 barracas. “Muita gente abandonou a favela em busca de trabalho”. Ele acusa o comandante da UPP, capitão Leo Ludolff, de não autorizar nenhum evento no morro. “Em outras ainda existem bailes, aqui nunca pode.” Em nota, a Coordenarias de Polícia Pacificadora afirma que alguns pedidos são negados pois não cumprem a resolução Seseg/SEDEC nº 134, que regula a realização de eventos em espaços públicos no Estado. E que os produtores ainda precisariam de um ‘nada a opor’ de outros órgãos, como Bombeiros.