Por Pedro H. Villas Bôas Castelo Branco* e Lier Pires Ferreira**
O que há de novo no recente morticínio do Jacarezinho? Operações policiais bélicas em favelas são uma rotina no Rio de Janeiro há mais de 40 anos. Com base no modelo falido de Segurança de Pública de “guerra ao crime”, elas partem do princípio de que criminosos são inimigos que devem ser executados, mesmo que isso não implique em redução da criminalidade. A recente incursão no Jacarezinho, batizada de Operação Exceptis, não seria diferente não fossem algumas circunstâncias que precisam ser iluminadas.
A brutalidade desmedida, que resultou em 28 mortes, dentre elas a do policial civil André Frias, alçou a incursão à ação policial de maior letalidade na história do estado. A maioria dos mortos não estava entre os destinatários dos mandados de prisão que fundamentaram a operação. Mas a surpresa maior reside em um detalhe: o momento da operação, deflagrada no dia seguinte à visita de Jair Bolsonaro ao recém-empossado governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro. Haveria alguma conexão entre a visita do presidente e a incursão policial?
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Bolsonaro trava uma batalha com as instituições democráticas, em particular o STF. A tensão hostil entre o Executivo e o Judiciário foi catalisada pela Covid-19, em razão de o Supremo ter restringido as operações policiais nas comunidades, para abrandar a crise sanitária em bairros pobres, superpopulosos, sem infraestrutura. O STF pôs em xeque o principal modus operandi de uma das principais bases de apoio de Bolsonaro.

O mesmo STF proferiu decisão em abril do ano passado pela competência de governadores e prefeitos para adotarem medidas de enfrentamento da crise sanitária. Fez, assim, Bolsonaro perder a liderança da gestão da pandemia e ver sua “política” de imunidade de rebanho ir por água abaixo.
A decisão do STF conseguiu de uma só vez abalar o presidente, sua base eleitoral policial e a “política de segurança” que elimina sistematicamente policiais, criminosos e inocentes. É preocupante pensar que na situação atual do Rio, o enfraquecimento do comando do tráfico abre caminho para a expansão da milícia com quem o presidente e seu clã têm antigos laços sombrios. A aliança entre presidente e governador e a operação policial estão no curso de ações estratégicas voltadas à reeleição de Jair Bolsonaro e seu aliado recém-empossado.
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É certo que a Operação Exceptis nada tinha de excepcional senão o fato de seguir uma estratégia de afrontar a Corte, agradar a base eleitoral com o modelo falido de guerra ao crime e retirar a CPI da covid do centro das atenções, jogando uma cortina de fumaça sobre os depoimentos que, até aqui, expõem falhas do governo na condução do combate à pandemia. Mirando em 2022, o presidente segue sua sombria cruzada contra a vida, sobretudo dos mais vulneráveis.

*É professor do IESP/UERJ. Coord. do LEPDESP

**É professor do Ibmec e do CPII. Pesquisador do LEPDESP