Karla SoaresDivulgação

O conceito de “territorialidade feminina” reflete a complexa relação das mulheres com os espaços que ocupam, ultrapassando os limites da geografia e inserindo-se nas esferas sociais e culturais. Ele abrange as formas pelas quais as mulheres constroem, marcam e reivindicam territórios, enfrentando desafios relacionados à segurança, ao respeito e à afirmação de suas identidades e vozes.

Compreender a territorialidade feminina é essencial para mapear as lutas e conquistas que têm fortalecido as mulheres e ampliado seus espaços de atuação. Em grandes centros urbanos e em comunidades mais vulneráveis, a necessidade de autonomia e proteção encontra paralelo com o sentimento de pertencimento e resistência. Essa dinâmica resulta na formação de redes de apoio que proporcionam às mulheres espaços seguros, de acolhimento e de desenvolvimento pessoal e coletivo.

Historicamente, o lar foi visto como o principal espaço de atuação das mulheres. Essa percepção, muitas vezes limitadora, restringia-as a papéis fixos e impedia uma participação plena nos espaços públicos. Entretanto, a resistência feminina transformou esse ambiente em um território estratégico, onde as mulheres começaram a desenvolver economias domésticas, projetos de sustento familiar e, em tempos de repressão, o utilizam como local de organização e articulação de movimentos sociais.

A partir do século XX, as mulheres passaram a conquistar mais espaços na sociedade. Nos bairros periféricos, em particular, a territorialidade feminina se revelou um elemento-chave na liderança de processos comunitários voltados para a melhoria das condições de vida. Mulheres à frente de movimentos por moradia, saúde pública, educação e segurança mostraram-se fundamentais para o desenvolvimento local. Esse engajamento fortaleceu a percepção da mulher como protagonista na luta por direitos e por um futuro mais justo.

No contexto das áreas urbanas, a ocupação dos espaços públicos é frequentemente impactada por questões de segurança, acesso e reconhecimento. O ato de se apropriar desses espaços representa, simbolicamente, a conquista de direitos e a expressão de liberdade. Iniciativas como rodas de conversa em praças, eventos culturais em espaços abertos e redes de apoio comunitárias são exemplos de construção de territorialidade que vão além da ocupação física: constituem um ato de afirmação e resistência à violência e ao preconceito.

No Rio de Janeiro, por exemplo, muitas comunidades têm lideranças femininas que trabalham ativamente para desenvolver ambientes seguros e acolhedores, fortalecendo redes de apoio contra a violência doméstica e oferecendo capacitação profissional, além de apoio psicológico. Esses são exemplos práticos de como a territorialidade feminina se manifesta de forma concreta, ajudando as mulheres a conquistar espaços e garantir sua permanência neles.

Em comunidades e bairros periféricos, a territorialidade feminina assume um caráter de união, cooperação e segurança. Através de redes de apoio, as mulheres constroem laços de confiança que as ajudam a enfrentar desafios cotidianos, criar ambientes de proteção mútua e fomentar a solidariedade. Esse processo fortalece não apenas a presença feminina nos territórios ocupados, mas também contribui para a transformação social e o empoderamento de suas comunidades.

Portanto, a territorialidade feminina é uma expressão da luta por visibilidade e representatividade. Ela simboliza a resistência e a capacidade de transformação das mulheres, que, ao reivindicarem seus espaços, não apenas ocupam territórios, mas também reconfiguram as dinâmicas sociais em prol de uma convivência mais justa e igualitária.
* Karla Soares, Mulher Preta, Assistente Social, Psicóloga e Coordenadora Social do Grupo Cultural AfroReggae